Se hoje as demandas já são maiores do que o dinheiro disponível, o cenário pode se complicar ainda mais. Caso a inflação não desacelere no segundo semestre, a folga no Orçamento ficará ainda menor.
Hoje, a previsão é que o governo se beneficie de um “descasamento” entre índices de inflação. O teto de gastos, que limita as despesas, é corrigido pelo IPCA acumulado em 12 meses até junho. Esse indicador registra alta de 8,06% até maio. Já as despesas do governo sobem pelo INPC, cujas previsões oscilam hoje entre 5,5% e 6,5%. Descontados outros aumentos de gastos, como concessões de novas aposentadorias e o reajuste dos militares aprovado em 2019, chega-se à “folga” de 2022.
Se a inflação continuar elevada até o fim do ano, porém, o valor disponível encolhe. O principal fator de risco para isso é a conta de luz. Diante da seca histórica, que ameaça o abastecimento de energia, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deve aumentar em mais de 20% o valor da bandeira vermelha 2, o patamar mais alto de cobrança extra nas tarifas. O reajuste bate direto na inflação, sobretudo no INPC, índice que capta os preços para famílias de menor renda – para as quais a conta de luz pesa mais no bolso.
Previsões
O espaço de R$ 25 bilhões foi indicado pelo secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, em entrevista ao Estadão/Broadcast no último domingo. A previsão, porém, é tida como conservadora pelo mercado. Há a avaliação de que já existe uma tentativa da equipe econômica de controlar expectativas e conter a sede por gastos em ano eleitoral.
“Pode significar uma tentativa de não sinalizar um espaço fiscal que é incerto”, afirma o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Felipe Salto. Nas contas da IFI, o espaço fiscal será de R$ 47 bilhões, mas cada 1 ponto porcentual a mais de inflação tira de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões desse valor.
Há ainda estimativas mais conservadoras no mercado – de folga de R$ 30 bilhões nos cálculos da RPS Capital e do BTG Pactual. O consenso dos especialistas, no entanto, é de que a inflação está com viés de alta e pode encurtar ainda mais a verba para novos gastos em ano eleitoral. “Se não tiver desinflação no segundo semestre, o espaço fiscal no ano que vem é menor e pode se exaurir rapidamente”, diz o sócio e economista-chefe da RPS Capital, Gabriel Leal de Barros.
Enquanto isso, Bolsonaro sinaliza mais gastos e afirmou na terça-feira passada que a reformulação do Bolsa Família pagará, em média, R$ 300 a partir de dezembro deste ano. O anúncio surpreendeu o próprio governo, que trabalhava até então com o valor médio de R$ 250 e um aumento na despesa de R$ 18,7 bilhões. O Estadão revelou ainda que o presidente encomendou ao ministro da Economia, Paulo Guedes, um reajuste para servidores públicos.
Também já é dada como certa a pressão de parlamentares para emplacar mais uma vez as chamadas emendas de relator, instrumento pelo qual os congressistas direcionam recursos para seus redutos eleitorais. Em 2022, as eleições incluem os cargos de deputado e uma cadeira de cada Estado para o Senado Federal.
“Sem ter espaço fiscal em 2021, eles conseguiram as emendas. Imagina no ano que vem, com espaço fiscal”, afirma Salto. “Para o político, é a senha para gastar, mas tem de ter muita cautela.”
Bolsonaro tem acenado com outras medidas populares do lado das receitas, como o aumento da faixa de isenção do IR, hoje em R$ 1,9 mil, e um programa de refinanciamento de dívidas tributárias de empresas. O pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e especialista em reforma tributária Rodrigo Orair já calculou que um aumento da faixa para R$ 3 mil beneficiaria cerca de 7 milhões de pessoas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Comentários estão fechados.