Há quatro dias, desde o início da conferência, jovens vindos de várias partes do mundo mudaram a cara da cidade escocesa e deram um ar de efervescência que, por vezes, chega a lembrar a da Rio-92, quando os olhos do planeta se voltaram para o Brasil e para o que acontecia na capital fluminense. Há festas, música, pubs lotados. Mas também há algo diferente no ar.
Ao contrário do tom festivo e de esperança que a conferência no Rio trazia no início dos anos 1990, o clima entre os jovens dos anos 2020 é outro, mediado pela urgência climática, a necessidade de tomadas de decisões “para ontem”, as cobranças para que seus futuros sejam levados em conta e as restrições impostas pela pandemia de covid-19.
“Nada foi feito, de fato, desde o Acordo de Paris. As NDCs (as metas voluntárias de corte de emissões) de muitos países simplesmente ficaram abaixo do aceitável, então não há muito o que celebrar e não há muita esperança”, diz Wictoria Jedroszkowak, de 20 anos. Ela e a amiga Dominica La Sota, de 19, fazem parte do Friday For Future, a mesma organização da jovem ativista Greta Thunberg, que se tornou a voz dessa geração na luta por um futuro mais limpo e sustentável.
Ambas são polonesas e juntaram “o que tinham e o que não tinham” para vir à Escócia. Entre a empolgação da primeira COP, o sentimento de urgência e o desapontamento (menos com o evento e mais com o tempo das tomadas de decisões), elas parecem pender mais para os dois últimos. “No segundo dia (quando os líderes mundiais estavam reunidos), não nos deixaram entrar para protestar”, diz Dominica. “Isso é ridículo. É o que fazemos, esse é nosso papel.”
Ao redor do local em que a COP ocorre, jovens de todas as nacionalidades circulam de um lado para o outro. Representantes dos povos indígenas, do Brasil e de outros países da América do Sul, se misturam e tomam o protagonismo no debate ambiental. Eric Terena é um deles. Além de ser uma jovem liderança é também DJ e se apresentou durante a conferência.
URGÊNCIA
As festas? Para Ines Belliard e Zahra Ahmad, ambas de 26 anos, estudantes em Londres, ok, fazem parte. Ver os pubs da cidade lotados com gente de terno e gravata que acabou de sair das reuniões da COP, porém, causa nelas um sentimento estranho. “Ainda não atingiram nenhum objetivo concreto. Não há o que comemorar”, diz Zahra.
“Estão tratando do nosso futuro”, reclama Ines. Para ela, o futuro mais próximo do que se imaginava mostrado pelo relatório do IPCC, o painel de cientistas da ONU, em agosto, não dá outra opção a não ser cobrar urgência. Segundo o documento, a Terra está esquentando mais rápido do que era previsto e se prepara para atingir 1,5º C acima do nível pré-industrial já na década de 2030, dez anos antes do esperado, o que tornará eventos climáticos extremos, como enchentes e ondas de calor, mais frequentes.
O único caminho, aponta o relatório, é limitar o gás carbônico na atmosfera, atingindo pelo menos zero líquido de emissões (saldo das emissões descontada a absorção do carbono), juntamente com grandes reduções em outras emissões de gases do efeito estufa. O Acordo de Paris prevê zerar as emissões líquidas até 2050.
A primeira semana da COP mostra alguns avanços. Na quarta, países desenvolvidos como EUA, Austrália, Canadá e Japão se comprometeram a aumentar seus repasses ao fundo internacional de financiamento de ações contra mudanças climáticas em países em desenvolvimento. Os valores ainda não chegam aos US$ 100 bilhões anuais previstos, mas apontam para a vontade de negociar. A Aliança Financeira de Emissões Zero de Glasgow, grupo que inclui as maiores instituições financeiras ocidentais, anunciou a criação de outro fundo, este de US$ 100 bilhões.
O Brasil, nos primeiros dias da conferência, suavizou a retórica de confronto adotada pela gestão Jair Bolsonaro, se alinhou aos EUA e à União Europeia e reviu sua NDC. Além disso, ingressou no acordo para diminuir as emissões de metano, proposto pelos EUA, e anunciou planos de zerar o desmate ilegal.
Tudo isso soa positivo para o jovem nigeriano Ugochukwu Bobo Ajuzie, de 22 anos, mas ainda não muda a realidade que vê em seu país. “Os problemas na África vão do desflorestamento à dependência extrema de combustíveis fósseis. Mas também há problemas sérios como falta de acesso a uma fonte mais limpa de combustível”, diz. “No meu país, muita gente usa querosene para isso.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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