Rede canadense é modelo de combate ao bullying

Flori Antonio Tasca

Apesar da alta prevalência do bullying no Brasil, são poucas as intervenções de forma sistemática no combate da sua prática, ao contrário do que acontece na América do Norte, onde já foram explicitadas as etapas consideradas necessárias para reagir ao fenômeno. Por mais que não seja aconselhável transpor um modelo de avaliação de um país para o outro, desconsiderando o contexto brasileiro, conhecer as experiências de outros países pode ser enriquecedor para as pesquisas e esforços preventivos no Brasil.

Tendo isso em mente, as pesquisadoras Ana Carina Stelko-Pereira e Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams fizeram o estudo “Desenvolvimento da rede para enfrentar o bullying: lições canadenses”, publicado em 2012 na revista “Psicologia Escolar e Educacional”. Elas trataram da rede canadense PREVnet, que, em português, significa “Promovendo Relacionamentos e Eliminando a Violência”. A rede foi criada para educar, prover ferramentas e auxiliar no desenvolvimento de estratégias e de políticas públicas voltadas ao enfrentamento do bullying. Suas estratégias de ação são variadas e abarcam diferentes públicos, como os próprios alunos, os pais e os educadores.

A rede tomou uma série de medidas práticas voltadas para as crianças, que incluem a divulgação de um número de telefone, caso precisem de ajuda, panfletos que indicam o que fazer se a criança for vítima, autor ou testemunha de bullying, um modelo de carta para contar a um adulto caso estejam envolvidos no bullying, além de vídeos de curta duração, entre outras atividades. Os pais também são orientados sobre como agir caso o seu filho esteja em uma situação de bullying e há estratégias para uma relação adequada entre pais e filhos. Há ainda orientações específicas para caso o filho tenha orientação homoafetiva.

Todos os profissionais envolvidos na educação, desde o motorista do ônibus escolar até os líderes recreativos, são conscientizados de que exercem um papel importante no combate do problema, pois servem de modelo para as crianças e os adolescentes. Igualmente, eles são orientados sobre como proceder em situações de bullying. São sugeridas ainda à escola discussões, dramatizações, colagens e pesquisas relacionadas à prática de bullying.

Também são promovidas e apoiadas campanhas relacionadas à garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes. Há um concurso entre alunos e escolas para selecionar as melhores atividades para combater o problema. A rede também facilita o contato com especialistas para fazerem palestras ou darem consultorias, além de publicar livros e artigos referentes a pesquisas e resultados de investigações na área. São oferecidos subsídios para a criação de diversos materiais de combate, até jogos de videogame.

Há uma intensa participação da rede na mídia nacional. Ela colabora com comitês para a elaboração de leis. Uma comissão permanente de planejamento define os objetivos da rede. Há ainda os parceiros. No tempo de publicação do estudo, havia um total de 62 pesquisadores de 24 universidades e 50 organizações atuando como parceiros da rede. Ela é financiada por empresas privadas, entidades públicas, doações e vendas de materiais, como livros e camisetas. São feitas avaliações constantes das atividades.

Para as autoras do estudo, a PREVnet pode servir como exemplo de atuação para o Brasil. Para isso, é preciso se ater a algumas lições que ela oferece. A primeira é a de que o bullying é responsabilidade de todos e que, portanto, o seu enfrentamento deve ser articulado entre diversos setores sociais. Mais importante do que criar serviços e entidades que competirão por recursos é articular aquelas já existentes. Pesquisadores também devem ser unir, a despeito de suas diferenças metodológicas ou teóricas.

Deve-se, ainda, buscar alternativas de criação de relacionamentos saudáveis, em vez de simplesmente impor ameaças, medos e reprimendas para conter a prática. Quanto ao financiamento das atividades, ele deve partir de diferentes fontes dos setores público e privado. A rede deve ter um intenso comprometimento com a pesquisa e, naturalmente, deve ser transparente perante a sociedade e os seus próprios financiadores.

As autoras reconhecem que não é uma tarefa fácil, mas consideram que a iniciativa é propícia, diante da alta prevalência do bullying em nosso meio e da urgência em se encontrar soluções para o seu enfrentamento e prevenção.

Educador, Filósofo e Jurista. Diretor do Instituto Flamma – Educação Corporativa. Doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná, fa.tasca@tascaadvogados.adv.br

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