No capítulo 25,31-46, de São Mateus, encontramos o “julgamento das nações” e, noutras traduções o texto é conhecido como a “parábola do juízo final”. Trata-se, portanto, de uma obra prima no conjunto dos escritos teológicos de Mateus, no exercício ministerial de Jesus Cristo Salvador e Redentor, o pastor messiânico. Este texto, muito apreciado, apresenta uma religião prática, constituída de ações de bondade e de amor ao próximo. Segundo São Jerônimo (347-420), presbítero e doutor da Igreja “ele foi interpretado como um argumento de quem nem a fé em Cristo, nem a participação na Igreja são necessárias para a salvação; mas, na verdade, ele se dirige aos discípulos cristãos, e o discipulado é ousadamente compreendido como o equivalente ao cuidado com os necessitados. Isto não significa uma negação da fé; faz parte da essência da fé”.
O “Filho do Homem” – diga-se Jesus Cristo, sentado no trono da glória, recebendo diante dele todas as nações – todos os povos da terra, para o julgamento final. Escreve Mateus que Ele separará uns dos outros, como um pastor separa as ovelhas das cabras. O critério dessa separação são as obras de misericórdia. Elas servem para especificar o preceito capital do amor ao próximo. Jesus fez-se próximo do necessitado e irmão dos pequenos e famintos, sobremaneira. Seguimos o evangelho em questão. Colocará as ovelhas à sua direita e as cabras à sua esquerda. O Senhor então dirá aos da direita: “Vinde, benditos de meu Pai, para herdar o reino preparado para vós desde a criação do mundo” (v. 34).
Vejamos quem Jesus primeiro nomeia nesta lista da prática da misericórdia, do amor ao próximo, como critério fundamental para a salvação. “Porque tive fome e me destes de comer” (v. 35). Os justos surpreendidos indagam ao Senhor: “Senhor, quando te vimos faminto e te alimentamos? (v. 37). Eis a resposta: “Eu vos asseguro: o que fizestes a estes meus irmãos menores, a mim o fizestes” (v. 40). Aos que estiveram à sua esquerda, a condenação é severa: “Afastai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno preparado para o diabo e seus anjos. Porque tive fome e não me deste de comer” (vv. 41-42). Diante da observação objetiva de Jesus, aos que passam fome e não foram assistidos pela caridade, replicam-lhe: “Senhor, quando te vimos faminto?” (v. 44).
O que não fizestes a um destes mais pequenos, não o fizestes a mim!
O Mestre Jesus respondeu aos seus interlocutores de ontem e hoje: “Eu vos asseguro: o que não fizestes a um destes mais pequenos, não o fizestes a mim” (v. 45). Esta resposta fantástica e interpeladora identifica o auxílio ao carente com o amor a Cristo. Nesta obra de misericórdia de assistir aos famintos, Jesus pressupõe a responsabilidade moral e a consciência humana deste dever e que Deus leva as ações humanas a sério. Este é seu critério de julgamento, a caridade gratuita para com o necessitado; ele se identifica com os necessitados.
A parábola de Jesus explica o critério do juízo final: as obras de solidariedade, feitas ou deixadas de fazer aos pobres famintos, são as que decidem a participação ou não-participação do Reino. A bondade gratuita revela-se quando a gente se dedica aos que não podem retribuir. É na doação ao “último dos filhos de Deus”, o faminto, que damos provas de uma misericórdia evangélica e divina.
Para nós cristãos, deve ser acima de tudo, assumir a causa dos que mais precisam. Essa foi a escolha de Deus. Essa foi a causa nobre de Jesus. Aqui reside, portanto, o critério para a nossa salvação. Viver amando e servindo. Contudo, é isso que vence o mundo. É deste amor não interesseiro que Cristo pedirá contas na hora decisiva. Se o caminho quaresmal é um sinal do caminho que trilhamos rumo à salvação plena, a Páscoa, é oportuno acompanhar o modo como Jesus descreveu esse caminho, no que chamamos no cristianismo de “regra de ouro”.
Dom Edgar Xavier Ertl – Bispo da Diocese de Palmas-Francisco Beltrão
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