Apesar de acatar o pedido do Executivo, Carreiro incluiu a conectividade das escolas públicas do País como uma nova contrapartida para as teles que vencerem a disputa. O governo espera realizar a licitação até o fim deste ano, mas a forma como esse compromisso deverá ser posto de pé pode atrasar a disputa, prevista para ocorrer até o fim deste ano.
O leilão do 5G será a maior licitação de telecomunicações da história do País. O valor presente líquido de todas as faixas que serão leiloadas – 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHZ) – foi estimado em R$ 45,759 bilhões, e o valor dos compromissos, em R$ 37,079 bilhões. Dessa forma, a outorga mínima seria de R$ 8,680 bilhões, sendo R$ 1,355 bilhões para as teles que comprarem as faixas de cobertura nacional da faixa de 3,5 GHZ, a principal para o 5G.
O edital já havia sido aprovado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em 25 de fevereiro, mas ainda precisa passar pelo crivo do TCU antes de ser publicado. Com a decisão da maioria da corte de contas, o ministro Aroldo Cedraz, que havia pedido vista do processo, terá de trazer sua análise já na próxima semana – nesta quarta, 18, sete ministros anteciparam posicionamento favorável ao voto de Carreiro, isolando Cedraz. Depois que for aprovado pelo TCU, o edital voltará para a Anatel, que terá que ajustá-lo para acatar as determinações da corte de contas. Somente depois disso será possível marcar com segurança uma data para o leilão.
De acordo com o edital original, as empresas deveriam começar a ofertar 5G nas capitais e no Distrito Federal até julho de 2022, Para municípios com mais de 500 mil habitantes, o prazo limite era julho de 2025; para aqueles com população acima de 200 mil, julho de 2026; e para os com mais de 100 mil, julho de 2027. Esses prazos terão que ser adiados, mas as teles poderão, também, antecipar o cronograma.
Atraso
O governo planejava fazer o leilão ainda no primeiro semestre, para evitar que o Brasil ficasse atrasado relativamente a outros países do mundo no 5G. A maioria dos países oferece um sinal mais veloz que o 4G, mas alguns deles a partir de sobras de outras faixas que não a frequência de 3,5 GHz. O ministro Fabio Faria, no entanto, disse que se trata de propaganda enganosa e entrou com processo para impedir as operadoras de dizerem que ofertam 5G no País na Secretaria Nacional do Consumidor.
Dados da GSMA, entidade que representa operadoras móveis em todo o mundo, apontam que já há 5G em operação nos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, África do Sul, além de vários países na Europa. O primeiro foi a Coreia do Sul, e a maioria já realizou leilões nos últimos dois anos. Os países mais atrasados são Portugal e os da América Latina e África.
Para Juarez Quadros, ex-ministro das Comunicações e ex-presidente da Anatel, o Brasil já está ficando para trás. “Estamos atrasados. A Anatel iniciou o processo em 2018. Decorrem três anos de trabalhos. Espero que o leilão ocorra ainda em 2021”, disse. Segundo ele, até maio deste ano, 159 operadoras em 66 países já haviam lançado o 5G móvel. Na modalidade fixa, o 5G já era ofertado por 62 empresas em 35 países, disse Quadros.
Compromissos
Como forma de reduzir o valor da outorga que as empresas deverão pagar pela faixa, o governo decidiu impor obrigações de investimento. Cada compromisso será abatido do bônus que as empresas teriam que pagar ao Tesouro. O Ministério das Comunicações, porém, decidiu incluir no edital dois compromissos que nada tem a ver com o 5G. Para a rede privativa, o limite de investimentos vinculados ao edital será de R$ 1 bilhão, e para o PAIS, de R$ 1,5 bilhão.
Para os técnicos, a rede privativa e o projeto de conexão do Norte eram ilegais e representavam uma tentativa de excluir despesas públicas do Orçamento para desviar do teto de gastos. Na avaliação deles, os dois projetos configuravam atividade-meio da administração pública e deveriam ser contratados por licitação, execução direta da Telebras ou por meio de Parceria Público-Privada (PPP) – alternativas que o governo queria evitar.
A manutenção desses investimentos no edital era tratada como prioridade pelo governo, que formou uma força-tarefa para convencer os ministros do TCU a acatá-los. A todo custo, o governo queria evitar ter que fazer uma licitação para viabilizar ambos os projetos e direcionar recursos do Orçamento para realizá-los. Pelo edital proposto por Carreiro, ambos terão que ser tocados pela teles, por meio da Entidade Administradora da Faixa de 3,5 GHz (EAF), que será formada logo após o leilão.
O relator considerou a rede privativa e o PAIS eram projetos excepcionais, relevantes e de caráter coletivo. Ele destacou que o TCU vai acompanhar a execução dos projetos e que poderá punir os responsáveis caso haja problemas ou desvios. Depois que estiver pronta, a rede deverá ser repassada para a União, e não mais para a Telebrás. Esse posicionamento do relator contrário à área técnica foi um dos pontos que motivou o pedido de vista de Cedraz.
A rede privativa será a única em que haverá restrição ao uso de equipamentos da chinesa Huawei, líder mundial na tecnologia 5G. Apesar de toda a polêmica envolvendo os ataques de uma parte do governo à China, o edital não proíbe a empresa de fornecer equipamentos às redes comerciais das teles que disputarem o leilão – são as operadoras que escolhem os fornecedores, e a Huawei está no Brasil há 23 anos no País e com forte presença nas redes de 3G e 4G.
A vedação à companhia era defendida pelo ex-chanceler Ernesto Araújo e pelos militares, mas o Legislativo, especialmente a bancada ruralista, era contra. Qualquer proibição somente poderia ser concretizada por meio de decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro – o que, até o momento, não ocorreu.
Escolas
O relator acatou ainda um projeto proposto pela Comissão de Educação da Câmara, para incluir a conectividade de todas as escolas públicas de Educação Básica até 2024 entre as obrigações que as teles deverão cumprir no edital. Para ele, o compromisso de universalizar o acesso à internet banda larga na educação é relevante e já estava previsto em leis anteriores. Detalhes específicos sobre quais escolas serão atendidas e com que nível de qualidade e velocidade de conexão deverão ser definidos pelo Ministério da Educação.
Segundo o relator, esse projeto seria incluído como contrapartida para quem adquirir a faixa de 26 GHz, a única que não tinha compromissos no edital original, cuja outorga custaria R$ 6 bilhões. Essa faixa tem maior capacidade, mas menor alcance, e será voltada para usos específicos da indústria. O modelo proposto prevê que os valores arrecadados com a frequência sejam repassados à entidade administradora, a quem caberá viabilizar o projeto.
Demais investimentos
Também foram incluídos como compromissos para outras faixas. Na faixa principal do 5G, além do PAIS e da rede privativa, as teles deverão limpar a faixa de 3,5 GHz para poder transmitir o sinal sem interferências. Para isso, terão que pagar pela migração dos canais satelitais, que usam a frequência para transmissão de sinal de TV parabólica, para outra banda satelital – conhecida como banda kU – em até 300 dias após a assinatura dos contratos.
Para não deixar famílias carentes e que dependem das parabólicas sem TV, as teles deverão distribuir kits àquelas atendidas por programas sociais do governo. Ao todo, esse projeto deve custar R$ 3 bilhões. As operadoras também terão de cobrir todos os municípios com 5G e instalar backhaul.
Para a faixa de 700 MHz, remanescente do leilão 4G realizado em 2014, as vencedoras deverão implantar 4G em localidades de municípios ainda desconectados e rodovias. Por determinação do Ministério das Comunicações, a prioridade é a instalação de cobertura móvel em seis rodovias federais. Terão preferência as BR 163, 364, 242, 135, 101 e 116. Atualmente, os trechos sem sinal nessas rodovias somam 48 mil quilômetros.
Na faixa de 2,3 GHz, será preciso instalar 4G em localidades e municípios ainda sem sinal.
Comentários estão fechados.