Além de interagir com torcedores e fazer parte de diversas correntes, o goleador evita entrar em polêmicas e usa de sua imagem para promover o bem. Em outras ocasiões, ele chegou a pedir mais trabalho para o povo brasileiro e mais comida na mesa para esses mesmos trabalhadores. Richarlison aparenta comentar o que sente sem provocar atritos. Há pessoas que o ajudam com as ferramentas digitais.
O mais recente feito do jogador é bem importante e busca a conscientização das pessoas, além de mostrar o quão diferente dos demais atletas ele é. Em carta aberta, o atacante pede que todos que se vacinem contra a covid-19 e aposta no diálogo para convencer os ainda indecisos depois de quase dois anos de pandemia. O mundo atingiu 5 milhões de mortes pela doença. No Brasil, 608 mil pessoas perderam suas vidas vitimadas pela covid. “Por favor, não deixe de tomar sua vacina!”, escreveu em sua publicação.
O futebol inglês vive uma campanha forte para a vacinação dos atletas do Campeonato Inglês. No Brasil, em recente reportagem do Estadão, os clubes da Série A estão com quase todos seus jogadores imunizados ao menos com a primeira dose.
O Estadão ouviu especialistas em comunicação para saber da importância de atos como os de Richarlison para a campanha de vacinação no País – o Brasil tem quase 75% de sua população vacinada com a primeira dose e 55% com a segunda, fazendo com que o índice de contaminação caia, assim como o das mortes pela doença. Para os profissionais procurados pela reportagem, o artilheiro é único, diferenciado em sua bolha, e está construindo um papel importante com seus engajamentos nas redes.
“Ele é um exemplo de jogador de futebol brasileiro que tem atributos muito fortes de comunicação contemporânea. É um criador de conteúdo, um criador de tendência, um cara que tem a dança do pombo e que sabe se expressar com códigos de memes, que são bem recebidos pelo público jovem de rede social, que está em busca de uma comunicação mais divertida, mais lúdica, mais evasiva até certo ponto”, aponta o especialista em novas tecnologias do esporte, Bruno Maia, CEO da Feel The Match, que completa: “Essa voz ativa, essa consciência do seu posicionamento, da sua responsabilidade e o bom uso dessa voz são sem dúvidas atributos desses tempos que a gente vive e viverá nos próximos anos. O Richarlison talvez seja o atleta de futebol brasileiro que melhor se junta a isso.”
Nem todos os jogadores de futebol têm essa consciência, ou se têm, preferem não se posicionar publicamente. Algumas bandeiras, no entanto, estão sendo levantadas pela turma do esporte, como contra o racismo e qualquer tipo de preconceito. As passeatas e manifestações após a morte de George Floyd, nos Estados Unidos, despertaram isso em algumas personalidades esportivas, como o piloto de Fórmula 1, Lewis Hamilton. Floyd foi um afro-americano assassinado em Minneapolis em 25 de maio de 2020, estrangulado pelo policial branco Derek Chauvin, que se ajoelhou em seu pescoço durante uma abordagem por supostamente usar nota falsa de US$ 20 em um mercado.
“Os atletas em geral precisam entender que possuem um poder midiático incrível, e ele é o maior exemplo disso no Brasil. É claro que isso traz pontos negativos e positivos, perdem sua privacidade e passam a ter de pensar muito antes de um posicionamento que possua como cidadãos que são, mas em contrapartida tem um poder de conexão gigante, podendo ter várias frentes de trabalho não somente para obter ganhos financeiros e de imagem, mas também para colaborarem em prol de um mundo melhor”, aponta Renê Salviano, fundador da empresa HeatMap e ex-diretor comercial, marketing e novos negócios do Cruzeiro, e há mais de 20 anos com experiência no mercado.
“Atletas como Richarlison, que se dispõe de forma natural a se posicionar publicamente sobre assuntos de impacto social, podem se beneficiar ao ganhar uma relevância que vai além da performance esportiva. É importante saber distinguir polêmicas desnecessárias de assuntos de interesse real, mas ao defender abertamente temas como vacinação em massa, vejo aí uma oportunidade de consolidar a imagem pública do atleta de forma positiva, o que pode atrair o interesse de marcas que também não se eximem de se posicionarem sobre temas”, acrescentou Felipe Soalheiro, diretor da SportBiz Consulting.
Como não houve campanhas nacionais no Brasil para mostrar a importância da vacina e sua eficácia, as redes sociais serviram como plataforma de manifestar opiniões sobre o assunto. Personalidades de todos os segmentos se posicionaram. Richarlison não deixou a oportunidade passar.
“Muita gente acha que é falta de vontade dos caras de se posicionar, mas não é bem assim. De onde a gente vem, ninguém nunca quis saber o que a gente tinha para falar. E quando o nosso trabalho faz com que as nossas vozes sejam ouvidas, muitos jogadores já não querem mais esse desgaste. Cada um tem suas feridas, sabe o tanto que ralou para chegar aonde chegou e as pessoas precisam entender isso. É difícil você encontrar um jogador que não ajuda sua comunidade ou não faz um trabalho social. Ajudam o quanto podem”, disse ao Estadão quando pediu mais comida na mesa dos trabalhadores.
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