Na decisão, de 49 páginas, Rosa se disse “perplexa” com o esquema de distribuição de recursos públicos. “Causa perplexidade a descoberta de que parcela significativa do Orçamento da União esteja sendo ofertada a grupo de parlamentares, mediante distribuição arbitrária entabulada entre coalizões políticas, para que tais congressistas utilizem recursos públicos conforme seus interesses pessoais, sem a observância de critérios objetivos destinados à concretização das políticas públicas a que deveriam servir as despesas”, afirmou a ministra.
Rosa pontuou ainda que os recursos eram distribuídos “sem qualquer justificação fundada em critérios técnicos ou jurídicos, realizada por vias informais e obscuras, sem que os dados dessas operações sequer sejam registrados para efeito de controle por parte das autoridades competentes ou da população lesada”.
Na liminar, a ministra determina que nenhum recurso indicado por parlamentares via emendas de relator-geral seja liberado até que os demais integrantes do Supremo se manifestem sobre o tema. Após a decisão de Rosa, o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, convocou uma sessão extraordinária para julgamento. A análise será feita no plenário virtual entre os dias 9 e 10.
A decisão de Rosa respondeu a questionamento de quatro partidos, PSOL, Novo, Cidadania e PSB, que pediam a suspensão dos pagamentos de emenda de relator após o Estadão revelar o esquema. Dois deles, Cidadania e PSB, que têm parlamentares beneficiados pelo orçamento secreto, chegaram a recuar, mas a ação prosseguiu mesmo assim.
PEC DOS PRECATÓRIOS
No gabinete de Rosa desde junho, a decisão foi dada no mesmo dia em que o Estadão revelou a continuidade da prática pelo Planalto, com a distribuição de R$ 1,2 bilhão a deputados na véspera da votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios. Ao jornal, o deputado Celso Maldaner (MDB-SC) admitiu que a oferta levada a parlamentares foi de R$ 15 milhões por voto. A PEC em questão, que permite a Bolsonaro criar um novo programa social às vésperas da eleição de 2022, levou o pré-candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes, a suspender sua postulação após deputados do seu partido votarem a favor.
COOPTAÇÃO
A prática de troca de emendas por votos no Congresso também ocorreu em outros governos. Mas Bolsonaro inovou ao utilizar as emendas de relator(RP-9) – antes previstas apenas para correções na peça orçamentária – como forma de distribuir recursos às margens da fiscalização do eleitor e de órgãos de controle do dinheiro público.
O Estadão só conseguiu descobrir a prática após ter acesso a documentos internos do governo, não registrados nos sistemas públicos de informações, que revelavam o manejo de bilhões de reais por parte de deputados e senadores em acordos sigilosos com o Palácio do Planalto. Esse mecanismo fere a Constituição, que prevê transparência e equidade na distribuição dos recursos a parlamentares.
O flagrante do manejo sem controle de dinheiro público aparece num conjunto de 101 ofícios, obtidos pelo Estadão ao longo de três meses, que foram enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados para indicar onde o dinheiro deveria ser aplicado e até mesmo o valor. A maioria determinou a compra de tratores, muitos adquiridos com sobrepreço, o que deu ao esquema o apelido de “tratoraço”. As compras acima do preço são hoje reconhecidas até mesmo pelo governo, que suspendeu parte delas.
TRANSPARÊNCIA
Além de suspender todos os pagamentos, a ministra Rosa Weber determinou que seja dada ampla publicidade às indicações feitas pelos parlamentares com esse tipo de emenda. Em outro ponto do despacho, ela exige que “todas as demandas de parlamentares”, “independentemente da modalidade de aplicação”, sejam registradas em plataforma eletrônica mantida pelo governo, com acesso público e com mecanismos de transparência ativa – isto é, com a divulgação dos dados pelo governo, sem necessidade de pedido prévio por parte dos interessados.
“Reputa-se violado o princípio republicano em face de comportamentos institucionais incompatíveis com os princípios da publicidade e da impessoalidade dos atos da administração pública e com o regime de transparência no uso dos recursos financeiros do Estado”, escreveu a ministra.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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