Nunes começou a segunda-feira como presidente interino da CBF após Rogério Caboclo ser afastado por 30 dias no domingo. O cartola é acusado de assédio moral e sexual contra uma funcionária, o que ele nega. Ainda nesta segunda-feira, uma reunião entre os oito vice-presidentes da CBF irá definir como será a gestão da entidade durante este período.
Coronel reformado da Polícia Militar do Pará, Antônio Carlos Nunes por décadas foi o homem forte do futebol de seu Estado – ele comandou a federação Estadual por seis mandatos -, mas nunca teve poder político em âmbito nacional. Na verdade, ficou marcado mais pelos deslizes e afrontas do que por qualquer outra coisa.
Nunes só chegou à presidência da CBF em 2016 após manobra política do então presidente Marco Polo del Nero, a quem o coronel já definiu publicamente como “amigo de muitos anos”. Assim, sua presença hoje à frente da entidade é um reforço para Del Nero, que ainda se reúne em sua casa com os chefões atuais do futebol brasileiro.
Aqui, é importante fazer um parêntese e entender o contexto. Em 2015, quando foi preso na Suíça, o ex-presidente da CBF José Maria Marin ocupava uma das cinco vice-presidências da entidade. À época, o estatuto previa que, na ausência do presidente, quem assumiria o cargo seria o vice mais velho – no caso, Marin. Mas, como ele não poderia despachar da penitenciária dos EUA, o cargo passaria automaticamente ao segundo mais velho: Delfim Peixoto, opositor de Del Nero.
Na iminência de ser afastado pela Fifa, Del Nero manobrou para evitar que um desafeto seu assumisse seu cargo. Pelo estatuto, o único jeito era colocar na vaga de Marin – que representava a região sudeste – um cartola mais velho que Delfim. E foi aí que surgiu o nome de Antônio Carlos Nunes de Lima, um paraense que acabou eleito vice pela região sudeste. Posteriormente, o estatuto da CBF foi mudado, os vices saltaram de cinco para oito, e agora o mais velho só assume de forma interina, por 30 dias.
Depois de toda essa manobra, o Coronel Nunes assumiu a presidência no fim de 2017, quando Marco Polo del Nero foi banido do futebol pela Fifa. Seu mandato tampão foi marcado por deslizes, uma crise com a Fifa e, principalmente, com a Conmebol – justamente com quem ele precisa lidar agora para a organização da Copa América.
VOTO NO MARROCOS – A crise começou durante a Copa do Mundo da Rússia, em 2018. Durante o torneio, a Fifa organizou seu congresso para a escolha da sede do Mundial de 2026. A Conmebol havia feito com um acordo com seus dez países para votação na candidatura conjunta de Canadá, México e Estados Unidos. Na hora da votação, porém, Antônio Carlos Nunes votou no Marrocos.
A mudança irritou muito os dirigentes da Confederação Sul-Americana. O presidente da Associação de Futebol Argentino (AFA), Claudio Tapia, chamou o voto de Nunes de “traição”. Gianni Infantino, que comanda a Fifa e que já foi chamado pelo coronel de “Gianini”, não escondeu seu constrangimento e pediu que o cartola brasileiro fosse afastado das decisões importantes. Só quem ficou feliz pelo voto foi Marco Polo del Nero, que teria telefonado para Nunes para parabenizá-lo pela postura.
Ainda naquela Copa da Rússia, Antônio Carlos Nunes se envolveu em uma confusão num restaurante. Um torcedor brasileiro, que morava no Pará e estava naquele país para assistir aos jogos do Mundial, reconheceu o cartola, proferiu xingamentos e lhe acertou um tapa. Um assessor do coronel interveio e também foi agredido, revidando com um copo atirado. O torcedor foi parar no hospital. Nunes voltou para o Brasil.
PREFERÊNCIAS – O coronel Nunes é um homem afeito a conversas, e em geral nunca se recusa a dar declarações sobre os assuntos em pauta. Justamente por isso, raramente é visto sem a companhia de algum assessor, que em geral apressa o cartola para que ele não fale muito.
Quando foi eleito vice-presidente da CBF, em dezembro de 2015, Nunes não teve direito a uma entrevista coletiva – isso tampouco aconteceu quando assumiu a presidência, o que, aliás, se tornou comum. Mas, naquele dia, o coronel conseguiu driblar os assessores e apareceu para conversar com quem fazia plantão na sede da CBF. E revelou suas preferências.
À época, Dunga treinava a seleção brasileira e, tal qual Tite nos dias de hoje, via seu cargo a perigo. Indagado sobre a situação de Dunga, o coronel Nunes disse gostar do técnico, mas via outros bons treinadores pelo Brasil. “Para mim (o melhor técnico do País) é o Dado Cavalcanti, que recuperou o Paysandu e quase chegou no G-4 (da Série B)”, comentou. Também via Jorginho, à frente do Vasco, como um bom nome.
Ele também disse que não se importava em ser tratado como Coronel Nunes – na CBF, o uso da patente era vetado pelos assessores. “Eu só não quero que o tesoureiro do quartel não bote lá que sou coronel, que daí meu dinheiro vai lá para baixo”, justificou.
Nunes assume todas as decisões da CBF com o afastamento de Rogério Caboclo. Vai ‘governar’ com seus pares na entidade, mantendo a lealdade ao banido presidente Del Nero, que ainda não pode deixar o Brasil com risco de ser preso.
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