Saúde alertou que Precisa não poderia firmar contrato em nome da Bharat

A Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde alertou em um parecer emitido em 24 de fevereiro que o papel de representante da Precisa Medicamentos na venda da vacina indiana Covaxin não incluía o de firmar contratos em nome da Bharat Biotech, fabricante do imunizante.

“A Precisa até representa a Bharat em algumas ações (apresentar documentos, iniciar discussões, inscrever-se para estudos de fase III), mas dentre elas não está a de firmar contratos”, aponta o documento da Conjur, emitido um dia antes de o governo assinar o contrato para compra da Covaxin.

O parecer foi apresentado pela senadora Simone Tebet (MDB-MS) durante sessão da CPI da Covid nesta quarta-feira (18). A senadora, que foi responsável por analisar durante o recesso parlamentar a documentação do negócio fechado entre a Precisa e o governo Bolsonaro, classificou o contrato como “fraudulento e obscuro”. “O que disse a Conjur, o processo está todo errado”, afirmou Tebet.

A aquisição da vacina é alvo de várias investigações por suspeita de irregularidades e corrupção, na CPI da Covid, na Polícia Federal (PF) e no Ministério Público Federal (MPF). Após as suspeitas serem reveladas, o Ministério da Saúde suspendeu o contrato, para depois decidir cancelá-lo.

No parecer do setor jurídico do governo exibido pela senadora, há um alerta sobre a diferença entre a Precisa ser um “distribuidor exclusivo” e de ser um representante ou procurador da Bharat. Na primeira situação, o distribuidor teria a posse do produto do fabricante e o venderia em nome próprio.

Já na segunda hipótese, de representante, a condição assumida é de “vendedor”. Nesse caso, a venda é feita em nome do fabricante. “No caso, há uma operação única de entrada da mercadoria no País e entrega: o produto iria diretamente da Bharat para a União, sem intermediários, ao menos sob o ponto de vista das relações jurídicas”, afirma a Conjur.

A consultoria então aponta que o contrato dá a entender, por sua vez, que a Precisa meramente representaria a Bharat. Diante disso, recomenda que a área técnica enquadrasse a situação da Precisa de forma “motivada”. “Se a Precisa atuar como distribuidora, a área demandante deve atestar, pela documentação dos autos, que tal empresa realmente possui autorização para distribuição da vacina em questão no País”, aponta o documento.

Na avaliação da senadora, a Precisa não poderia ter assinado o contrato com o governo federal, e o fez com uma procuração falsa, afirmou Tebet. “O Ministério da Saúde não poderia dizer que não sabia (que a procuração era falsa), ela grita aos olhos, não tem fé pública, porque ela não está registrada a procuração, tem erros na digitação”, disse a senadora. A Bharat já veio a público afirmar que não assinou um documento que autorizava a Precisa para ser a “representante legal e exclusiva no Brasil com poder de receber todas as notificações do Governo”.

A apresentação de Tebet foi feita durante a oitiva do advogado da Precisa, Túlio Silveira. Como apontam emails exibidos pela senadora, Silveira cobrou que o Ministério da Saúde assinasse o contrato de compra da Covaxin “o quanto antes”. O contato foi feito pelo advogado em email para o então secretário-Executivo da pasta, Elcio Franco.

“Mesmo faltando uma série de documentos, você pressiona o Ministério para assinar o contrato”, afirmou Tebet. A senadora também questionou o fato de a diretora da Precisa, Emanuela Medrades, ter assinado o contrato como pessoa física. “É um contrato fraudulento”, disse a senadora.

O papel da Precisa na negociação também levantou dúvidas na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apontou Tebet. Dois dias antes da assinatura do contrato, em resposta ao pedido de autorização excepcional de importação das doses, a Anvisa pede que se esclareça quem é o importador, se a Precisa ou o Ministério da Saúde. Ao fim, a Licença de Importação foi emitida no dia seguinte com essa função atribuída à pasta.

Além disso, no dia 24 de fevereiro, a Anvisa pede que o peticionamento no processo fosse feito pelo “importador legitimado”, ou seja, o Ministério da Saúde. “O motivo de tal solicitação se deve ao fato de que a interveniente, Precisa Medicamentos, tem, por intermédio de mensagens eletrônicas (e-mail), copiado setores e diretorias da Anvisa com informações alusivas ao processo, o que pode causar tumulto à instrução processual”, afirma a agência.

Invoices

Tebet também disse que a invoice (nota fiscal) do contrato apresentada como potencialmente falsa pelo governo Bolsonaro é verdadeira. Logo após o deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmar que existiam suspeitas de irregularidades na negociação e na invoice, o então ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, e Elcio Franco trataram o documento como possivelmente falso. Essa versão foi reforçada pelo governo por meio da conta Secretaria de Comunicação Social no Twitter. “O ministro (Onyx) e Elcio vieram a público e mentiram”, disse Tebet.

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