O parecer da Câmara incluiu um dispositivo que alterava o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e criava condições que aumentavam a necessidade de buscar esse tipo de serviço na renegociação de dívidas. Pelo texto, o credor deveria remeter títulos ou documentos da dívida ao tabelionato de protesto com a recomendação de prévia solução negocial.
Esse trecho acabou sendo retirado pelo Senado. Além da equipe econômica, senadores da oposição, como Paulo Rocha (PT-PA), também haviam se mobilizado contra a medida. Mas o relator, Rodrigo Cunha (PSDB-AL), se antecipou e suprimiu o artigo de seu relatório. Como o texto era de autoria do Senado, ele segue agora para sanção presidencial.
“Oferecemos reservas a esta inclusão, porque, mesmo na hipótese de uma solução negocial, o devedor precisaria arcar com as despesas de emolumentos, agravando assim a sua situação financeira”, diz o parecer de Cunha. Após ler seu relatório, o senador criticou o jabuti. “É um projeto extremamente maduro e debatido, e na reta final acrescentaram mudança que geraria custos ao consumidor”, afirmou o relator.
O Broadcast apurou que, ao longo do dia, o governo correu para o Senado para apontar os seus pontos negativos para a economia doméstica. Uma frente foi acionada para tentar alcançar o maior número de senadores possível, mas o responsável por convencer o relator tranquilizou os colegas da equipe ao ter o retorno de que ele suprimiria o artigo incorporado pela Câmara.
A preocupação da equipe econômica era a de que a medida ia exatamente na contramão da intenção do governo de melhorar o ambiente de negócios no Brasil. Esta foi uma das promessas feitas pelo presidente Jair Bolsonaro, em sua primeira viagem internacional depois de eleito. Em Davos, na Suíça, ele disse que levaria o País a ser um dos 50 melhores para se fazer negócio. No fim de março, o presidente assinou uma medida provisória que tem a intenção de fazer o Brasil subir 20 pontos no ranking Doing Business, do Banco Mundial. No encerramento de 2020, o País estava na 124ª posição.
O projeto de lei do superendividamento prevê mais transparência nos contratos de empréstimos, um limite de 30% da remuneração mensal no caso de tomada de crédito consignado e a desistência de um financiamento em até sete dias sem necessidade de justificativas para tal.
Além disso, a proposta enfatiza a proibição de propagandas consideradas enganosas, como o anúncio de parcelamento sem taxas de juros – já que elas costumam estar embutidas. O texto também impede condutas consideradas extorsivas, como não entregar cópia de contrato para o consumidor e maquiar informações sobre os riscos de adquirir um empréstimo, e audiências de negociação.
Dados do Banco Central apontam que, durante a crise econômica gerada pela pandemia de coronavírus, o nível de endividamento doméstico atingiu seu mais alto patamar da série histórica e chegou em fevereiro a 57,7% apenas com o sistema financeiro. Se forem descontados os empréstimos imobiliários, o endividamento ficou em 35,5% no mesmo mês. O cálculo do BC leva em conta o total das dívidas dividido pela renda no período de 21 meses.
É chamada de superendividamento a quantia tida como impossível de ser paga pelo consumidor. De acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), atualmente 30 milhões de brasileiros têm débitos que não conseguem quitar. O cartão de crédito é a principal fonte de dívidas das famílias, seguido pelo carnê e pelo financiamento de veículos. O tema é popular e os partidos querem mostrar que estão fazendo parte para acenar às suas bases, principalmente num ano pré-eleitoral.
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