Somos mais artistas do que pensamos

            Dia 02 de novembro último, celebramos o dia de finados, ocasião que se repete todos os anos para rememoramos aqueles e aquelas que passaram pelas nossas vidas, são parentes próximos ou distantes, amigos e amigas ou até mesmo personalidades que marcaram um tempo, pessoas que partiram a pouco tempo ou a décadas, não importa, elas estão dia e noite em nossos corações e mentes, o tempo que passamos com elas com certeza teve momentos muito bonitos, engraçados e também tristes, é o ciclo da existência humana, isto é, nascer, crescer, se desenvolver, amadurecer e partir. Uma pessoa que nos deixa abre de certo modo um vácuo na nossa existência, sabemos por experiência própria que a nossa história fica incompleta com a pessoa amada que se foi, coisas não foram ditas, nem explicadas por qualquer dos lados; isso nos lembra que temos uma só chance.

            Nossa existência só chegou onde chegou, estamos vivos, contemplando esse mundo ora belo, ora triste, ora absurdo,  é porque tantas pessoas queridas vieram antes de nós, prepararam o terreno, o tempo de nossos antepassados não foi melhor nem pior do que agora estamos vivendo, erro tremendo é julgarmos a história de nossos entes queridos que se foram, com os critérios de hoje, mediocridade achar que eles eram antiquados, que não nos legaram absolutamente nada, é um crime dizer que o mundo de nossos antepassados era envolto em trevas e obscuridades. Eles viveram o tempo deles, eles tinham aquilo que lhes possível no seu momento de vida, não fossem eles quantas coisas não teríamos hoje, nossos entes nos amaram do jeito deles, nos abraçaram do jeito que sabiam, esquecer esses e outros detalhes, é trair a vida, é ser pequeno demais, minúsculo.

            Na atualidade banalizada, tudo se é feito para não prestarmos atenção nesse evento que é inexorável à existência humana, sutilmente vemos rodar uma campanha para eliminarmos esse evento do nosso meio, embora a morte grasse com extrema facilidade sob qualquer ângulo que se olhe ela, ninguém quer a morte mas ela nos ronda feito um cão feroz, odiamos a guerra com todas as forças, mas ela produz cadáveres aos borbotões, a máquina de produzir mortes inocentes e desnecessárias não para de crescer e isso com a nossa complacência, o nosso silêncio, a nossa conivência. A indústria técnica da morte é cada vez mais aperfeiçoada, ela rende muito dinheiro, pouco ou nada importa quem serão as vítimas hoje, amanhã ou depois. Com o comércio da morte cirurgicamente programado, algumas indústrias estão milionárias, um paradoxo altamente abjeto e também intrigante.

            Queiramos ou não, não podemos desviar a nossa mente e o nosso pensamento para Gaza e a Ucrânia, dois cemitérios a céu aberto, as noticias e as imagens que nos chegam dão mostram de quanto o ser humano tem se rebaixado e muitos ainda tem a infame coragem de criticar os tempos passados, dizendo que lá atrás o ser humano viveu tempos tenebrosos e obscuros. Pensemos nas tantas vítimas inocentes que nada fizeram para que esses massacres continuem a se perpetuar, pensemos nos seus algozes, que com seus rostos sorridentes e discursos só de aparência continuam fechando acordos criminosos para que tudo fique como está. Pensemos nos pais que perderam seus filhos, pensemos nos filhos que perderam seus pais, parentes e amigos, a escola, as praças, as brincadeiras, os lares e o trabalho; quem de nós teria nesse momento, palavras de conforto para elas?

            Bioeticamente, a morte é um elemento central em nossa existência, por mais que se tente afastar dela ou fingir que ela não está aí, nem muito menos vai nos atingir, é pura ilusão que a “alta civilização da técnica” tenta nos impor goela abaixo, somos mortais e assim continuaremos por muito tempo, a morte deveria ser um acontecimento natural para cada um de nós, leva-se muito tempo para vivermos bem conosco mesmo, alguns nunca chegaram ou chegarão a viver minimamente consciente das suas fraquezas e fragilidades. Não adianta viver iludido por essa ou aquela propaganda, os que promovem mortes horrendas também um dia terão a sua, resta saber quantos e quantas irão chorar por eles; fiquemos com a lembrança daqueles que viveram honradamente, que nos transmitiram pensamentos e desejos bons, a todos eles o nosso muito obrigado, a nossa gratidão eterna.

Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia, ambos pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, Doutor e Mestre em Filosofia, professor titular do programa de Bioética pela PUC-PR. Emails: ber2007@hotmail.com e anor.sganzerla@gmail.com

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