Suas palavras dizem paz, mas seus olhares, a morte

​A abundância da barbárie dá o que pensar, ou seja, uma guerra aparentemente acaba num piscar de olhos, uma outra continua, com as estradas da diplomacia cada vez mais esburacadas devido um acúmulo inimaginável de interesses colocados em jogo, a sobrevivência de uns amparada em mortes de inocentes, nas decisões que geralmente são tomadas em belos salões de festas macabras, ou se preferirmos, é só trazermos à tona “war pigs”, da lendária banda Black Sabbath, que entre outras coisas retrata a realidade antiga e nova, assim: “mentes malignas que tramam destruição, feiticeiros que edificam a morte, no campo os corpos queimam, enquanto a máquina de guerra continua funcionando, morte e ódio à humanidade, políticos se escondem, eles só iniciaram a guerra, por que eles deveriam lutar? Eles deixam esse papel para os pobres”, esses fazem guerra por diversão.

​Essa e tantas outras canções nunca perderam as suas verdades irretocáveis, antigas e novas, são um exemplo claro de quanto mais poder se tem, mais ele corrompe qualquer um até a raiz da sua existência, é a superabundância da mesquinharia, uma derrota incomensurável para todos nós e principalmente para o meio ambiente em geral, temos agora a multidão de famintos de Gaza, os genocídios econômicos devidamente orquestrados para dizimarem os que já tem muito pouco, o Planeta de algumas décadas para cá foi transformado rapidamente numa grande empresa essa é a verdade, muitos departamentos sendo fechados por serem tidos como obsoletos, outros por não darem o lucro esperado, outros tantos pelo seu pessoal não corresponder ao pensamento atual; essa é a atualidade global, cínica, impiedosa, seletiva, desprovida de qualquer compaixão.

​A vida no seu conjunto inteiro parece estar indo numa rota de colisão certeira com o imprevisível, uma batida que caso venha a acontecer poderá ter consequências inimagináveis, para tudo e para todos, já tivemos uma pequena amostra com a vinda do ser invisível, o mundo da conexão alimenta n esperanças duvidosas, um futuro envolto numa caixa de museu, a vulnerabilidade do agora não é percebida como real e imediata, ela é deixada de lado por ser simples demais e tão clara como o sol que nasce todos os dias. Brincar despreocupadamente com o amanhã parece não ser nada inofensivo, nada que assuste ou preocupe nossa já desgastada consciência, num momento crucial onde o nós, é a palavra chave para a salvação, o eu, me, mim, comigo é tido como a última e perigosa aventura suicida, uma alternativa que bate de frente e nos faz correr muitos riscos.

​Olhar para Gaza e sua população fragilizada e faminta, requer audácia e muita coragem acima de tudo, ali sem meias palavras está ocorrendo um massacre, um morticínio de proporções inimagináveis, as imagens e vozes que nos chegam dão conta de que os inocentes, os maiores vitimizados, todos os dias é mais ataques e cada vez menos comida e água para a população, em Gaza tudo é desproporcional, isto é, a bestialidade humana, a crueldade, a ferocidade, uma punição mais do que excessiva para com os mais fracos, enquanto os barões do crime, como nos lembra “war pigs”, ali, as pessoas são tratadas meramente como peões num tabuleiro de xadrez, se vão continuar ou não existindo, isso é uma mera conjectura mental sem importância; é assustador e ensurdecedor o silêncio que presenciamos, ele apenas nos mostra que o tão sonhado futuro é apenas uma bela ilusão.

​Bioeticamente, nossas ilusões são ainda muitas e cruéis, mas esse vendaval de contradições de alguma forma precisa ser aplacado e revisto em sua inteireza, nosso silêncio precisa ser transformado em voz ativa e não ficarmos como meros espectadores de uma brutalidade insana, consumindo sem mais nem menos fatos que deveriam nos envergonhar ao extremo, não podemos deixar que o mal real seja o vencedor, ele não tem nada a nos oferecer, ele no fundo não garante a vitória mesmo que seja o vencedor, se isso vier a ocorrer podemos estar certos que alguma coisa está errada nessa conjuntura. Graças a Deu ainda temos muitos e bons pontos de referência, em relação a aventura humana nessa existência conturbada; alguns querem nos transmitir à força que existir hoje é um mito, quando isso é uma verdade irretocável, não nos deixemos trapacear pelas vãs ilusões.

Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia, ambos pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, Doutor e Mestre em Filosofia, professor titular do programa de Bioética pela PUC-PR. Emails: ber2007@hotmail.com e anor.sganzerla@gmail.com