Quando negociaram em 2020 o acordo com o governo de Donald Trump, que levou à saída das forças ocidentais do país após 20 anos de guerra, os taleban prometeram que não protegeriam os combatentes da Al-Qaeda e não permitiriam que o território afegão fosse usado para o planejamento de ataques terroristas no exterior. Mas essa promessa não convence ninguém.
“Os taleban nunca foram sinceros sobre a ruptura de suas relações com a Al-Qaeda e nunca deveríamos ter acreditado neles”, afirmou Michael Rubin, ex-funcionário do Pentágono e pesquisador do centro de estudos conservador American Enterprise Institute.
“Não estamos falando de dois grupos militares que cortaram suas relações, e sim de irmãos ou primos. A presença dos Estados Unidos e da Otan impediu que a Al-Qaeda utilizasse o Afeganistão como um santuário. Não podiam operar livremente. Agora, todas as apostas estão abertas”, disse Rubin, em entrevista à agência AFP.
As relações entre os dois braços de um Islã político fundamentalista são muito próximas em vários aspectos. Os pais de Sirajuddin Haqqani e do mulá Mohammad Yaqoob, ambos altos dirigentes do Taleban, eram ligados a Bin Laden. O líder religioso taleban Haibatullah Akhundzada foi elogiado como “emir dos fiéis” pelo líder da Al-Qaeda Ayman al-Zawahiri quando foi nomeado em 2016.
Edmund Fitton-Brown, coordenador da equipe da ONU responsável por monitorar o Estado Islâmico, a Al-Qaeda e os taleban, afirmou em fevereiro, em uma entrevista ao canal americano NBC, acreditar que a direção da Al-Qaeda seguia “sob a proteção” dos Taleban.
No entanto, a natureza real de seus vínculos ainda deve ser definida. Os taleban não podem cometer o mesmo erro de 20 anos atrás, sob risco de violentas represálias ocidentais, ou inclusive de isolamento da China ou Rússia, que muitos acreditam que reconhecerão rapidamente o novo regime.
O grupo fundado por Bin Laden também mudou profundamente nas últimas duas décadas. Com um funcionamento descentralizado, a Al-Qaeda chegou a vários países do mundo, do continente africano ao Sudeste da Ásia, passando pelo Oriente Médio. Apesar do enfraquecimento de seu órgão central, o grupo ganhou agilidade e resistência.
Sua presença no Afeganistão será mais clandestina, menos oficial, prevê o pesquisador do programa sobre extremismo da Universidade George Washington Aymenn Jawad al-Tamimi. “Não acredito que os taleban permitam que abram campos de treinamento onde possam ser detectados a partir do exterior e bombardeados”, afirmou.
Os novos governantes de Cabul podem tentar adotar uma política similar à de que o Irã é acusado, ou seja, “manter os líderes da Al-Qaeda sob prisão domiciliar, enquanto possibilitam margem de manobra para que se comuniquem com seus adeptos no exterior”, disse Tamimi.
No mínimo, a velocidade com que os taleban acabaram com o antigo governo demonstra sua força, assim como os erros de interpretação dos países ocidentais a respeito dos acontecimentos.
“Observe o que a CIA ignorou: os taleban começaram a negociar com os líderes locais para conseguirem sua deserção. Eles se mobilizaram por todo o país para se prepararem para ataques em cada capital de província”, disse Michael Rubin.
Uma nova situação deve se impor em todo o país. O grupo responsável pelos atentados do 11 de Setembro pode sonhar agora com uma reconstituição.
“O que está acontecendo no Afeganistão é uma clara e contundente vitória da Al-Qaeda”, disse Colin Clarke, diretor de pesquisas do Centro Soufan, com sede em Nova York. “É um evento que poderá ser utilizado para atrair novos recrutas e criar um impulso que a rede terrorista não consegue desde a morte de Bin Laden em 2011”, acrescentou. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
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