Estudioso, meticuloso e antenado com o que acontece no esporte mundo afora, Marquinhos Xavier reconhece o favoritismo do Brasil, mas reitera: “não estamos mais sozinhos”. Confira a entrevista concedida ao Estadão.
A seleção conta com jogadores que atuam no Brasil, Rússia, Portugal, Espanha… Essa mescla foi de propósito ou você simplesmente escolheu os melhores?
Nossa geografia no Brasil já é essa. A seleção sempre teve atletas atuando fora do nosso continente e dentro do País. Houve sempre uma mescla. Obviamente, pela projeção profissional eles acabam saindo do Brasil, às vezes muito jovens, e a gente tem um sacrifício a mais, um a trabalho a mais, de ficar monitorando todos eles. Eles acabam chegando a grandes equipes, o que vai facilitando o processo, e na hora da convocação os melhores são divididos entre os que estão aqui, na Europa ou na Ásia.
A pandemia atrapalhou muito a preparação?
De maneira particular, a preparação do Brasil foi bastante prejudicada. Já entramos na pandemia com alguns déficits de convocação. Perdemos algumas datas importantes, especialmente em 2019, que antecedeu à pandemia. Eram datas que poderiam ter sido utilizadas para que a gente pudesse ter tido a oportunidade de ver outros jogadores. Em 2020, após as Eliminatórias, a gente não teve mais convocações. Isso, de alguma forma, prejudicou a observação dos jogadores. Nós tínhamos ideias claras, de trazer mais jogadores para experimentar. Tratamos de focar na resolução desse problema com um período de preparação mais acentuado.
Atrapalhou também o monitoramento dos adversários?
Ele se dividiu em duas partes. A primeira é aquele monitoramento mais superficial, em que nas Datas Fifa você acaba observando jogos dos adversários. E a segunda, e mais importante para nós, é a etapa atual. Está todo mundo jogando agora, e há uma mudança de convocação, de comportamento das equipes também. Há a influência da ansiedade, da pressão. Você consegue ter um raio x mais próximo.
O Brasil teve uma experiência ruim na última Copa do Mundo, e teve uma série de problemas de organização com a CBFS. Agora, a seleção está sob o guarda-chuva da CBF…
É importante a gente separar as coisas. Temos que valorizar o que a CBFS fez durante todos esses anos. Se o Brasil chega hoje como um dos favoritos para ganhar essa Copa do Mundo, e com as cinco conquistas que teve, isso se deu pelo trabalho da CBFS. A questão administrativa, nós do departamento técnico não nos envolvemos. A partir do momento que a gente passa a estar sob o guarda-chuva efetivo da CBF a gente está desfrutando da melhor maneira possível, treinando na Granja Comary, tendo as instalações do Parque Olímpico o tempo todo… Isso é bom porque recupera uma parte do processo. Acho que o futuro do futsal pode ser ainda mais profissional e melhorar com essa parceria. Nós ainda não sentimos efetivamente o poder de toda essa mudança, mas ela já existe. Acho que após o Mundial a própria CBF vai ter tempo de organizar tudo isso, da forma que ela entende o futsal. Acho que quem vier no próximo ciclo vai encontrar uma casa mais organizada nesse sentido. Acho que a gente vai caminhar para uma evolução e para uma profissionalização efetiva da modalidade.
O Fernando Ferretti (ex-técnico da seleção) tem ajudado vocês na preparação. Como isso se dá?
Ele é nosso coordenador técnico, está comigo desde o início do ciclo. O projeto passa muito pelas mãos dele, pela experiência e conhecimento que ele tem. Ele tem uma expertise não só técnica, mas também de gerência do grupo, sobre como administrar alguns problemas e conflitos. Isso acontece em qualquer lugar. Ele tem uma presença muito marcante na comissão técnica, e fico feliz de tê-lo ao meu lado dando um suporte, sendo um bom conselheiro. Ele é multicampeão, e talvez nossa maior referência no futsal.
O Brasil tem cinco conquistas e sempre foi considerado um dos principais mercados do futsal do mundo. Nos acostumamos a pensar na Espanha como principal adversário, mas nos últimos anos a gente viu o crescimento de Rússia, Portugal e Irã, e a Argentina é a atual campeã. Qual a real condição do Brasil para ganhar esta Copa do Mundo?
Nós não estamos mais sozinhos, não é? Eu tenho dito essa frase com bastante frequência. O Mundial de 2016 mostrou que há a possibilidade de vencer, e também de fracassar. Isso está claro hoje. Ao lado de todas essas potências que fazem o futsal no mundo, eu colocaria ainda o Casaquistão, que é uma equipe que tem muitos brasileiros naturalizados e deve fazer um bom Mundial. Eu acho que nossas chances são reais, em função da competência técnica que nós temos e da qualidade individual dos nossos atletas. Agora, o nosso desafio – e isso ficou claro no último ciclo -, é que se nós não investirmos em preparação, em treinamento, em toda essa parte que forma uma grande seleção, a gente não ganha mais só com o talento. Não é mais só convocar e ir lá vencer. A gente precisa de estrutura, e estamos alertando há muito tempo. A estrutura que vai fazer a diferença: maior tempo de concentração e maiores oportunidades de convocação. A gente assume o favoritismo com muita humildade, sabendo que a gente não está sozinho, mas é a história da modalidade. Além dos cinco títulos que temos Fifa, nunca podemos esquecer que temos também dois Mundiais pela antiga federação internacional de futsal e que foi um marco. Temos que honrar esses sete títulos.
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