Dirceu Antonio Ruaro
No texto da semana passada, abordei a questão do “certo e errado”, afirmando que, mesmo que não queiramos ou aceitemos, o certo e o errado existem e não dependem apenas de um conceito pessoal. A vida em sociedade tem convenções que vão além do que eu ou você pensa a respeito de alguma coisa. Por isso, viver em sociedade implica aceitar, mesmo com restrições, conceitos convencionados na vivência da comunidade na qual se está inserido.
Em consequência do texto da semana passada, recebi um comentário de uma mãe que se dizia decepcionada, desesperada, aflita, com medo de estar errando na educação dos filhos. Disse, entre outras coisas, que a teimosia, a birra, as manhas, são muito frequentes e isso a deixa extremamente insegura e incomodada com a situação e enfim, pergunta: a educação de filhos é isso?
Tentando dar uma pista de resposta, pode ser isso também, mas não é só isso. Ninguém teima o tempo todo, faz birra o tempo todo ou faz manha o tempo todo.
A educação de filhos tem tempos intercalados de calmaria e de agitação. Como de resto é a vida de cada um de nós. O que é preciso entender é que as crianças vão crescendo, se desenvolvendo e (pode ficar brava/bravo comigo) e mudando os tipos de “teimosia”, brigas, desobediências. É só uma questão de tempo, e as coisas mudam. Muitas vezes para melhor, e outras, para pior.
Penso que educar filhos é uma coisa incerta, assim como no poema de Fernando Pessoa, que considera que “navegar é preciso, viver não é preciso”, referindo-se à questão da precisão, da certeza não da necessidade. A educação dos filhos é algo preciso, ou seja, necessário. Aqui o sentido é esse mesmo e não o de que estamos no caminho certo, da precisão, da exatidão. Bom, espero não ter confundido ainda mais o pensamento de vocês.
Mas, como diz Fernando Pessoa: “Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido…” e educado um filho, eu completaria.
A teimosia, a inconstância, as birras, as desobediências fazem parte do processo de aprendizagem da criança. Ah, seria maravilhoso, mesmo encantador, se bastasse dizer uma única vez. Porém sabemos que a paternidade quer seja do pai ou da mãe, é a tarefa mais difícil que os seres humanos têm a desempenhar.
Quando discuto a questão da disciplina dos filhos lembro-me de que Jean Piaget e Emanuel Kant, num estudo sobre a disciplina dos filhos, consideram que “a questão do lugar da disciplina ainda inquieta pais e educadores”.
E essa inquietação vem em razão de que não temos certeza de que estamos, naquele exato momento, tomando a atitude correta. Nem tomando a atitude correta e nem sabendo se é essa mesma a forma de agir.
E por que que isso? Uma das razões é porque cada família, cada indivíduo, cada membro da família tem um contexto familiar específico e, por isso mesmo, não adianta procurar no Google os “cinco passos para educar bem os filhos”, ah também não adianta buscar as 5 melhores dicas para acabar com a teimosia, a birra e a desobediência.
Ora, cada pessoa tem em si seus conceitos, especialmente os pais quando estão querendo educar os filhos para que não façam birra, não desobedeçam, não teimem, e esses conceitos interferem na maneira de pensar e agir com relação à educação dos filhos.
E, talvez, pela observação que tenho feito em relação a crianças menores, é que a maior dificuldade seja mesmo a questão da desobediência. Para alguns pode soar meio ridículo, mas quando observo na porta da sala de aula a mãe, aflita e envergonhada, pedindo ajuda a professora para que o seu “pequeno príncipe” coloque o agasalho, pois está frio, ou quando observo no supermercado o pai, entre envergonhado, aflito, nervoso e aponto de explodir, comprando bombons, balas e outras guloseimas a fim de evitar a exposição da potência das cordas vocais do filho de 4 anos, entendo a angústia e aflição que passam.
Mas ao mesmo tempo me pergunto: em que medida esse pai ou essa mãe, conversa, dialoga, explica o que é obediência e para que serve? Em que medida senta, calmamente, troca ideias, “convence” que fazer birras só atrai olhares de reprovação das pessoas que julgam o filho/filha como mal-educado(a), e o pai e a mãe como incompetentes para ensinar aos filho (a)? Ainda: em que medida os pais sentam e dialogam explicando que a família funciona dessa ou daquela maneira? Ou ainda: em que medida conversam sobre os conceitos de ética, moral, certo e errado?
Fazer isso com crianças pequenas? Sim, desde cedo. A melhor resposta aos problemas pode estar na capacidade da criança aprender a pensar em si mesma em relação aos outros. Ou seja, ela não é única, mas um ser em relação com os outros.
Em que medida os pais/mães de hoje são capazes de sentar e construir regras e normas de funcionamento da casa com os filhos desde pequenos? Educar, hoje, não se faz mais com autoritarismo, mas com a autoridade dos pais, construída ao longo da vida toda da família, mas, iniciando nos primeiros dias de vida do bebê, pense nisso enquanto lhe desejo boa semana.
Doutor em Educação pela UNICAMP, Psicopedagogo Clínico-Institucional e Pró-Reitor Acadêmico UNIMATER