A polarização política no Brasil supera até as diferenças entre classes sociais e religiões quando o assunto é “tensão social”, de acordo com o levantamento “Guerras Culturais”, da Ipsos. A cada dez brasileiros, oito dizem acreditar que há uma tensão elevada no País entre pessoas que defendem bandeiras partidárias diferentes.
O porcentual supera a média global de 28 países e coloca a polarização política como o principal catalisador de tensão por aqui, na percepção dos próprios brasileiros. Ou seja, briga-se mais por política partidária do que por qualquer outro assunto. Exemplos dessa tensão e da violência política não faltam, e vão de bate-boca em grupos de família até casos extremos, como as ameaças de morte recebidas por lideranças de esquerda eleitas em 2020.
Conversar com quem pensa diferente é apontado como um dos maiores desafios no Brasil de 2021 de acordo com quem tenta fazer política mesmo sem estar num cargo eleito. “O diálogo é obviamente necessário, mas está cada vez mais difícil promover o debate público em meio a tantas narrativas e fanatismo”, disse a empresária Amanda Vettorazzo, de 32 anos, filiada ao Patriota. “Chegamos ao ponto em que a verdade e a lógica não importam mais para boa parte das vozes ativas na política brasileira, o que deixa nossa democracia fragilizada.”
Para o professor Rafael Parente, 44 anos, ligado ao PSB, o ódio e as mentiras são as principais razões do problema. “Ficou mais difícil conversar. Muito da polarização é baseado em mentira e ódio, mas, ao mesmo tempo, o acirramento criou uma força contrária ao radicalismo, de relembrar que a diversidade brasileira é uma das nossas forças e que crescemos na diversidade e com a verdade.”
Diretor de Public Affairs da Ipsos no Brasil, Helio Gastaldi acredita que se trata de uma guerra de narrativas. “Na medida em que os polos políticos opostos apropriam-se de temas que supostamente agregam simpatizantes para suas fileiras, as opiniões sobre estes temas tornam-se também mais radicais e até sectárias, uma vez que teríamos cada grupo defendendo incondicionalmente determinadas posições e condenando enfaticamente outras, sem possibilidades para um olhar mais contemporizador.”
Falas de Bolsonaro e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que por enquanto protagonizam o debate antecipado pela disputa presidencial de 2022, têm ajudado a aumentar o clima de “Fla-Flu” político. O presidente já afirmou que o adversário, que lidera as pesquisas de intenção de voto, só ganhará a eleição se for na “fraude”. Já o petista disse que sempre “polarizou” contra candidatos do PSDB, mas nunca em “baixo nível”, justificando que vê a disputa com Bolsonaro como a “democracia” contra o “fascismo”.
“Um elemento fundamental para a diminuição da polarização e dos ânimos dos eleitores seria uma pactuação política, em que os próprios candidatos assumam uma posição de diálogo e não de confronto”, disse o cientista político Creomar de Souza, da consultoria Dharma. “(Mas) Acredito que isso não será feito. Os candidatos estão alimentando a lógica do confronto porque diminui a racionalidade do processo. O prognóstico é uma eleição tumultuada e com violência em 2022.”
Terceira via. A tentativa de consolidação de uma “terceira via” para 2022 acumula nomes: de governadores, como os tucanos João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), além do senador Tasso Jereissati (CE); os ex-ministros Ciro Gomes (PDT) e Luiz Henrique Mandetta (DEM); parlamentares como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e sua colega de Casa Simone Tebet (MDB-MS); a “outsiders”, como o apresentador José Luiz Datena (PSL).
Na pesquisa Ipec divulgada pelo Estadão em junho, Lula tinha 49%; Bolsonaro, 23%; e Ciro abria o bloco da terceira via com 7% das intenções de voto. “O principal dilema da terceira via passa por escolher um nome e buscar voto”, disse Souza.
A tendência, na avaliação da Ipsos, é de que o clima “bélico” da disputa eleitoral seja transmitido para o eleitor. “A estratégia adotada pelos grupos políticos que se antagonizam neste momento é justamente tratar os adversários políticos como inimigos mortais e buscar a aniquilação destes inimigos, justamente como ocorre em uma guerra”, afirmou Gastaldi. “A proximidade com a eleição deverá fazer a temperatura subir ainda mais, acentuando a polarização e a belicosidade dos participantes. Espero que haja uma saída, mas, qualquer que seja, ela está ainda muito distante.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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