O aplicativo ganhou o apelido de “Tinder do futebol”, uma referência à famosa plataforma de paquera. Se quando se trata de relacionamentos o programa serve para os usuários selecionarem pessoas interessantes e abrir janelas de conversa com quem se curtiu mutuamente, no ClubFut a estratégia é bem parecida. Voltada para garotos de 12 a 17 anos, a plataforma tem hoje mais de 40 mil perfis de atletas.
Ao se cadastrar, o garoto preenche vários dados. Fotos, vídeos, características de jogos, times onde atuou, idade, altura e telefone de contato estão entre as informações. Do outro lado da rede, clubes, empresários e observadores podem selecionar qual o perfil do talento buscado. Assim, se um dirigente procurar, por exemplo, um zagueiro canhoto de 16 anos, vai encontrar todas as opções. Ou seja, vai dar “match”.
Além dos 40 mil garotos, a ferramenta tem no cadastro 211 clubes, 360 treinadores e mais de 300 escolinhas de futebol. Os números foram divulgados pelos próprios idealizadores do aplicativo. A estimativa é de que desde o início da operação, em outubro de 2020, mais de 170 atletas foram captados por times graças à plataforma. Desse total, pelo menos 40 contratações foram para times das Séries A e B.
Os números, porém, devem ser ainda maiores porque o ClubFut não monitora os contatos realizados entre as partes e não atua no agenciamento dessas negociações. Todos os recrutamentos são feitos diretamente com os atletas. Os perfis deles trazem sempre um telefone para contato.
Um dos casos de maior sucesso do aplicativo é o lateral-esquerdo Enzo, de 14 anos. O garoto mora em Salvador e foi descoberto pelo Grêmio após cadastrar o perfil e participar de um torneio organizado pela própria ClubFut para divulgar a ferramenta. As características de Enzo já haviam chamado a atenção e logo depois de ser avaliado presencialmente ele recebeu a proposta da equipe gaúcha. Nas próximas semanas, o lateral vai arrumar as malas, se despedir da família e se mudar para Porto Alegre.
“Muitos meninos com grande talento nem sempre têm oportunidades no futebol porque não são vistos. O aplicativo abre portas justamente para isso. Moro na Bahia e, por causa da distância, seria difícil eu ser encontrado por um time do Sul”, disse Enzo. Ao montar o perfil, o garoto colocou informações sobre o estilo de jogo, foto e os telefones de contato da mãe e do empresário. “Quando me ligaram lá do Grêmio, eu achava que ainda ia fazer testes. Mas não. Já me procuraram para contratar”, contou.
O responsável por encontrar Enzo foi o observador técnico do Grêmio, Erivelton Lima. O funcionário do clube gaúcho mora em São Paulo e tem o trabalho de monitorar possíveis talentos e indicar contratações. Foi ele quem encontrou nomes importantes do time atual, como o meia Matheus Henrique e lateral-direito Vanderson. Agora, o observador usa essa experiência para navegar pela nova plataforma.
“Hoje o mundo está cada vez mais tecnológico. Eu vejo que aplicativos desse tipo vão cada vez mais se inserir no nosso contexto. A lógica da busca por talentos não muda no futebol, seja com aplicativo ou sem. Eu costumo dizer que a captação é um prato que se come quente. Se você esperar esfriar, vai perder a oportunidade de fazer um bom negócio”, explicou o observador técnico ao Estadão.
A ClubFut é uma plataforma gratuita por enquanto. Os idealizadores tiram o lucro graças aos anúncios publicitários. Porém, há o plano de o projeto passar em breve a cobrar pela manutenção do cadastro. Embora a comparação com o Tinder ou até com a rede social de empregos Linkedin seja inevitável para explicar o funcionamento, os criadores na verdade se inspiraram em outras páginas da internet para conceber o projeto.
O presidente da ClubFut, João Victor Carneiro, disse ter se baseado no Mercado Livre, por possibilitar dinamismo nas negociações e flexibilidade naquilo que se procura. A ideia da ferramenta veio após analisar o quanto os times brasileiros não aproveitam talentos por não conseguirem se aprimorar na captação de revelações.
“Quatro anos atrás, quando estive no Leste Europeu, tive contato com diversos atletas brasileiros que nunca jogaram a primeira nem a segunda divisão do futebol nacional, mas que estavam arrebentando no campeonato local”, contou. “A ideia é ter um site de anúncio de jogador, só que com o próprio jogador se anunciando para chegar nos clubes”, disse.
Diretor de mercado da empresa, Wellington Junior conversou com técnicos e outras pessoas do meio do futebol para entender qual era a demanda antes de desenvolver o projeto. “Existia um espaço no mercado para democratizar o acesso. Faltava algo para ser o ponto de encontro entre os clubes e jogadores que por vezes estão longe dos grandes centros. A pandemia potencializou esse trabalho”, explicou.
OUTRAS INICIATIVAS – O uso de tecnologia para o mercado de jogadores é bem comum na Europa. Uma das mais famosas é a TransferRoom, bastante popular na Inglaterra. Trata-se de um site em que clubes e dirigentes se cadastram e preenchem o perfil de jogador buscado. A ferramenta procura indicar se outro clube tem o estilo de reforço pretendido.
Um outro exemplo é o Dream Stock. O aplicativo criado no Japão está em atividade no Brasil desde 2017. A empresa propõe auxiliar os jogadores profissionais a serem informados sobre a realização de seletivas ou a se cadastrarem para oportunidades em times de outros países. O usuário pode também montar o perfil com vídeos, pretensão salarial e o currículo.
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