Até momento, todos os ministros seguiram o posicionamento de Alexandre de Moraes, relator do processo, que não viu impedimento legal ao emprego da delação como meio de obtenção de prova na esfera cível. Na avaliação do ministro, a Lei de Improbidade deve ser interpretada de acordo com o ‘microssistema legal de combate à corrupção e lavagem de dinheiro’ desenhado desde a sua aprovação.
“O combate à corrupção foi uma prioridade do legislador constituinte, porque a corrupção é a negativa do Estado constitucional”, disse. “A edição da nova lei incluiu a possibilidade de celebração de acordo de não persecução cível no âmbito da ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ou seja, previu expressamente essa possibilidade de justiça consensual para o combate a corrupção. E ela, mais do que isso, dentro do microssistema legal de combate à improbidade e à corrupção, reforçou o que já vinha sendo possível pela interpretação das demais leis: a plena possibilidade de colaboração premiada”, acrescentou.
Antes do pedido de vista, ele foi acompanhado pelos colegas Edson Fachin, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso. “Esta forma de administração consensual de litígios, especialmente na área da corrupção, é muitíssimo importante porque aí se obtém o caminho, muitas vezes, para se compreender a estrutura interna desses esquemas fraudulentos”, defendeu Barroso.
O entendimento predominante até o momento prevê que, nesses acordos, o dano ao patrimônio público seja integralmente ressarcido, sem possibilidade de negociação com o colaborador. A tese proposta por Moraes foi a seguinte:
“É constitucional a utilização da colaboração premiada nos termos da Lei nº 12850/2013 no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, observando-se as seguintes diretrizes: 1) as declarações do agentes colaborador, desacompanhadas de outros elementos de prova, são indeficientes para o início da ação civil por ato de improbidade; 2) a obrigação de ressarcimento do dano causado ao erário pelo agente colaborador deve ser integral, não podendo ser objeto de transação ou acordo, sendo válida a negociação em torno do modo e das condições para indenização; 3) o acordo de colaboração deverá ser celebrado pelo Ministério Público com a interveniência da pessoa jurídica de direito público interessada; 4) os acordos já firmados somente pelo Ministério Público ficam preservados até a data deste julgamento, desde que haja previsão do total ressarcimento do dano, tenham sido devidamente homologados em juízo e regularmente cumpridos pelo beneficiário.”
A discussão tem origem em um recurso extraordinário contra uma decisão do Tribunal de Justiça do Paraná, que manteve medidas cautelares impostas em uma ação por improbidade movida pelo Ministério Público do Estado na esteira da Operação Publicano, aberta contra auditores fiscais denunciados por corrupção para blindar empresários de fiscalizações tributárias na Receita estadual. O processo teria usado elementos colhidos em acordos de delação firmados no curso da investigação. O tema teve repercussão geral reconhecida, isto é, o entendimento fixado pelos ministros valerá como jurisprudência para novos casos.
Antes de votação, o procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu que a Constituição não proíbe o uso dos acordos na esfera civil. “O acordo de colaboração premiada é instituto de feição tipicamente penal, mas tem matriz constitucional, calcada nos princípios da eficiência e da efetividade da jurisdição. Trata-se de negócio jurídico-processual normalmente utilizado na apuração de situações fáticas complexas, que envolvem multiplicidade de ilícitos, com pluralidade de agentes envolvidos, e que reverberam nos variados planos do Direito. É comum que a colaboração revele fatos que configuram, a um só tempo, ilírico enaltecê-los, civil e administrativo. O Estado tem, por imposição constitucional, a obrigação de apurar os ilícitos e punir os respectivos infratores”, disse.
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