Segunda-feira foi o dia primeiro de maio, uma data histórica dedicada ao trabalho e a todos aqueles e aquelas que o exercem, inúmeras foram as formas de trabalho existentes ao longo dos séculos, hoje temos outras tantas e amanhã quem sabe, muitas outras virão que nem sequer supomos, alguns mais catastróficos dizem que não haverá trabalho, de concreto existem apenas e tão somente conjecturas a respeito. O trabalho e a pessoa andam de mãos dadas, dá muito o que refletir, sem essas mãos dadas o mundo não teria chegado onde chegou, somente o ser humano trabalha, apenas ele necessita colocar toda a sua inteligência, força e esperança no trabalho, desde sempre foi assim e sempre o será; o trabalho deixa suas marcas, tanto para o bem, quanto para o mal; ele embeleza o mundo à nossa volta, mas também possui a força de o denegrir, destruir e sim, quase tudo recriar.
Cada um de nós guarda dentro de si a experiência única do trabalho, somente eu posso falar do meu trabalho e ninguém mais, isto é, o mesmo trabalho exercido por outra pessoa contém nuances muito diferentes daquelas minhas, nem todos conseguem ter o trabalho que gostariam para dar aquilo de melhor que o mundo oferece, para a sua família, nem todos ganham um salário justo, seja aqui no Brasil ou em qualquer parte do mundo, aliás, salário é um outro ponto nevrálgico, ligado diretamente ao trabalho, talvez com raras e louváveis exceções, nunca na história humana houve salário justo para trabalhador algum. Hoje mais do que nunca, as condições do trabalho e dos seres humanos mudaram drasticamente, há uma interligação de tudo, o que afeta um, afeta a todos, a “badalada” globalização vem empurrar tudo e todos para as periferias da existência, poucos se salvam.
A mudança paradigmática de época e também de era que estamos vivendo na pele assusta qualquer um, perdeu-se o rumo, vagueia-se na escuridão da indiferença, da apatia, do ressentimento e do que poderá vir amanhã ou depois, significa que ninguém está no controle, que a força que ora se propaga sem freios em todos os lugares, caso não haja uma união entre todos, poderá nos derrubar por completo como sociedade. O trabalho de hoje gera muitos desafios e também riscos, pois nem todos os trabalhos estão aí para salvar a humanidade, bem ao contrário, pensemos por um breve espaço de tempo naqueles que fazem as guerras, constroem bombas, mísseis e todos os tipos de parafernálias militares para matarem, sejam pessoas, animais, o meio ambiente em geral, esse sim é um trabalho indecente e sujo; o trabalho quando usado para matar, não merece ser chamado trabalho.
Sabemos bem que o trabalho como aquele formador de consciência e coesão social nunca foi efetivado de verdade, antes ele foi e tem sido causa de inúmeras divisões no seio da sociedade, basta retrocedermos nossos olhares para um passado não muito longe de nós e notar que tanto o trabalho como os trabalhadores foram usados como massa manobrável ao sabor das paixões do momento, com o desenvolvimento cada vez mais frenético da tecnologia, aqueles que deveriam zelar pelos trabalhadores foram aos poucos sendo cooptados por forças muito superiores, resultado: um vasto afrouxamento nas leis trabalhistas, uma precarização cada vez maior, discursos flexibilizantes hipócritas que prometem uma enxurrada de novos postos de trabalho, mas promessa essa que nunca se cumpre; hoje mais do que nunca a questão de se vai ter ou não trabalho virou um pesadelo.
Quase um quarto do século XXI, cá estamos nós batalhando, os dilemas do primeiro de maio continuam, mas dessa vez é muito diferente das outras revoluções industriais, hoje se convive diuturnamente com a tecnologia, a nova deusa colocada em pedestais vistosos, a nova religião dos ufanistas que não querem nenhum tipo de controle em suas empreitadas arriscadas e temerárias; a resposta para o que estamos vivenciando está muito longe de alcançarmos, duas classes brincando com o fogo, no passado já tivemos a revolta dos luditas, hoje o embate entre aqueles que “sabem” quase tudo através da tecnologias e aquele exército enorme de despossuídos das ferramentas “milagrosas” é abissal. Não raro nossos trabalhadores se tornaram meros zumbis, tanto do dia, quanto da noite, por outras palavras, a alienação foi e é uma arma poderosa para derrubar toda e qualquer iniciativa.
Bioeticamente, o trabalho é um daqueles pilares centrais na estrutura humana, através dele o ser humano pode se realizar, assim como sem ele, a sociedade pode passar por profundas inquietações e dissabores, como aliás já percebemos isso faz tempo; o que não podemos fazer é ficarmos todos comtemplando de modo infantil todas as mudanças em curso, pensando que elas são inocentes ou ainda ficarmos distraídos nas pequenas alegrias conquistadas. O trabalho hoje longe de ser um encanto, tem sido alvo de profundas reflexões, o dia de amanhã, alucinado pelas conquistas tecnológicas, poderá produzir milhões de desempregados, leis cada vez mais obscuras e frágeis, sabemos já agora que um exército de máquinas está aí para eliminar postos de trabalhos, seria muito oportuno que nossos governantes ao invés de sobrecarregarem a população com impostos e mais impostos, que também taxassem as empresas a cada emprego tirado das pessoas pelas máquinas; nosso mundo só chegou onde chegou foi porque o trabalho humano colaborou.
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética e Especialista em Filosofia pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, é Doutor e Mestre em Filosofia, é professor titular de Bioética na PUCPR.
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