Me chamo Jose Roberto Stanqueviski, e sou pai de um jovem autista, o Samuel Menon Stanqueviski, o cara mais incrível que existe no mundo – e ele não tem ideia disso.
Meu filho foi diagnosticado com autismo com mais ou menos 5 anos. A gente nunca o deixou sem terapia, especialmente a fonoaudiologia. Ele nunca falou perfeito, mas no seu ritmo está evoluindo. Uma das frases mais longa que ele fala é “Eu te amo papai”, e sabe, isso é o suficiente para me fazer feliz para o resto da vida.
Depois que a gente se torna pai de uma criança especial, nós começamos a entender o mundo com outra forma, outra expressão, a linguagem não falada, a voz do coração. Dá sim uma certa apreensão quando ele tenta contar algo e não consegue verbalizar o que deseja, a gente não entende, então tenta com gestos, às vezes fica sem sentido, mas ele dentro de si, sabe exatamente o que está querendo contar. Nem sempre a gente termina essa conversa com entendimento de ambos os lados, mas quando isso acontece, nós celebramos.
Falar em celebração, a gente comemora tudo, pequenas e grandes conquistas. Desde ele provar algo de alimento uma única vez, até lugares novos que nunca foi, mesmo que lá tenhamos que ficar pouco tempo. Tudo é razão para alegria, motivação, parabenização. E afirmo, funciona. Nunca fizemos muitas trocas, no sentido de: Se você fizer isso, você ganha aquilo, nem quando era pequeno. Novas atividades nem sempre saem como a gente gostaria que saísse, mas tudo vale a pena para experimentar, mostrar, sentir o gosto e quando der vamos de novo, mais algumas vezes pra sentir se a primeira impressão era verdadeira.
Meu filho quebra vários padrões que especialistas falam sobre autistas, e talvez esse seja um dos maiores ensinamentos aos pais/mães de pessoas especiais. Digo que ouvir os estudiosos, especialistas é bom, ouvir às vezes a família ao redor é bom, mas no final, ali, é você(s) e teu filho, e é preciso olhar pra eles mais do que uma orientação médica. No geral autista não curte o contato, o abraço, o toque, não olha nos olhos, tem problema com barulho muito alto ou estridente, não gosta de interação social. Dizem que devemos preparar o autista para o que vai acontecer amanhã, para o que ele vai realizar, isso na regra geral vai deixá-los mais tranquilos, mais calmos e tudo acontecerá de forma mais serena.
Pois bem, meu filho abraça quem ele puder abraçar, pessoas que ele nunca viu na vida, se a energia bater, ele irá abraçar, o barulho muito alto de fato incomoda um pouco, mas precisa ser exagerado, no mais, ele não reclama. Com o tempo ele vem tendo varias mudanças de terapeutas, colegas de sala de aula, as vezes professores, e em todos os momentos ele vem se adaptando, então posso concluir que talvez nós é que subestimamos eles, julgando antecipadamente do que não são capazes, ou pior, nos escondendo atrás da dificuldade deles. E ainda temos a questão de preparar o autista para o que vai acontecer, falar do amanhã, penso que isso vale para muitos, não todos. O meu filho se ele não sabe exatamente o que vai acontecer, não compreender ele vai sofrer por não entender, então é melhor não contar. Se sabe que vai tomar uma vacina amanhã, e como não gosta muito, quem gosta né.. (risos), ele vai ter ansiedade até chegar a hora de tomar a vacina, então pra que contar? A estratégia é, deixa pra contar na hora, alguns minutos antes e aí vai lá e faz e está tudo bem.
O que quero dizer é, por mais que tenhamos uma orientação geral, talvez o teu filho tenha condições e respostas diferentes do que os médicos, medicina, entre tantos outros falam, talvez informar tudo com antecedência seja ótimo para ao teu filho(a), talvez de fato ele não goste do abraço ou toque, então calma, confia em você, confia nele, e vai de novo.
Esta semana, ao falar para uma pessoa sobre meu filho autista, ela me olhou e disse: Mas eles são gênios, amorosos, espertos, entre outros adjetivos super lindos. Claro que por desconhecer um autista em sua essência ela quis apenas ser educada. No entanto para nós pais esta uma das colocações que mais doem, é como se eu tivesse um gênio dentro de casa, mas eu sou tão tapado que não descobri. E muitas vezes são citados terceiros como o jogador Messi da Argentina, que nunca foi falado claramente que é autista. Tem autistas com habilidades diferenciadas? Tem sim.. mas na maioria os autistas são seres humanos diferenciados, nem melhor e nem pior, apenas diferentes. A maioria deles trava grandes lutas para conseguir falar, se expressar, tomar um banho, focar em algo, superar uma restrição alimentar, muitos convulsionam o que agrava seu quadro dentro do espectro, e essa é a realidade de mais de 90% dos autistas e suas famílias, então não podemos e não devemos tratar a maioria com o olhar da minoria, é como romantizar algo que não tem nada de romântico, isso aqui é vida, é luta.
Travamos batalhas diárias para que pequenas evoluções aconteçam. Algumas vezes perdemos e nestes dias dói muito. Às vezes, tudo está tão bem e em um minuto muda tudo, ele está triste, chora, fica sentido, e, aparentemente nada aconteceu, e a gente fica sem chão. A dificuldade da fala atrapalha em ser mais assertivo e poder ajudar, a gente senta e chora junto, ele chora por algo que está dentro de si e não consegue explicar e a gente por sentir a sua dor e se sentir impotente perante algo tão forte quando o espectro. Mas tudo passa, e o amor é o remédio, o amor é pergunta e o amor é a resposta. Abraçar, acalmar, dar colo, dar atenção, ser paz faz com que ele volte, e aí serena o coração e a alegria se faz presente novamente, levantar a voz, brigar ou algo neste sentido nunca será a melhor solução.
Eu sempre quis ser pai, acredito que essa é minha vocação. Para o ser humano, descobrir a sua vocação e realiza-la, é o ponto mais alto que ele pode chegar nessa passagem terrena. Sinto-me realizado em ser pai do Samuel Menon Stanqueviski, ele é diferente, especial, não só pelo espectro autista, mas pelo ser humano que ele é. Minha missão é ser pai, ser paz, ser confiança, ser alguém que ele possa se espelhar. Sou realizado como pai e encantado com o filho que tenho. Digo que ele me salvou como ser humano, ele me transforma, me modifica, me molda, e se eu não aprender nada com ele, não evoluir, a culpa será única e exclusivamente minha, porque ao que me parece, ele está cumprindo a sua missão em plenitude.
Esta estrada em ser pai de um Autista nunca terá um fim. Todos os dias uma nova ideia, um novo desafio, e a busca para ele ser melhor, para evoluir, pra tentar ser independente é permanente. Vou contar nosso segredo pra vocês, nós temos um super poder, e esse super poder se chama “ser feliz”. Quando a gente é feliz, nós fazemos quem está ao nosso redor feliz, e isso é contagiante. Então eu sempre irei perguntar a meu filho: Você está feliz? Se a resposta for sim, estarei eu também feliz. O universo autista não requer grandes coisas para ser feliz, não precisa de materialidade, não tem desejos de consumismo, na simplicidade de uma sessão de cócegas, mesmo aos 16 anos, mora um lindo momento feliz, estar lá empurrando ele no balanço e gritar “ihuullll” é uma sessão completa de felicidade, correr que nem doido dentro de casa, no parque ou na pista de atletismo, terminando em risos, abraço e beijo é uma injeção de felicidade. Somos felizes o tempo todo? Não, não somos, mas buscamos ser feliz a cada oportunidade.
Nós não olhamos o copo meio vazio, pra gente, ele sempre estará meio cheio. Para Deus importa mais a nossa batalha do que a nossa vitória, importa mais o caminhar da estrada do que a chegada, e assim nos vamos indo, e assim eu prefiro falar, contar, e celebrar as coisas boas, do que me debruçar sobre as dificuldades, terapias que não temos, evolução que talvez não aconteça, etc, etc, etc… então vivemos um dia por vez, olhando o passado como aprendizado, o futuro como uma possibilidade e vivendo o presente, o agora, algo que o Samuel faz com maestria e me ensina, com o seu amor, a ser um homem melhor.
Beijos pra quem é de beijos, abraços pra quem é de abraços e um UPA mega especial do Samuel pra você.
Jose Roberto Stanqueviski – Pai do autista Samuel Menon Stanqueviski
Comentários estão fechados.