Em um momento em que a economia entrou em recessão técnica – com a queda de 0,1% no Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre – e no qual o brasileiro médio sofre com a queda na renda e a inflação, as construtoras correm para oferecer aos “super-ricos”, que parecem alheios à derrocada econômica do País, experiências que não deixam a desejar aos mais sofisticados hotéis e clubes de campo.
Uma pesquisa da Brain, consultoria especializada no mercado imobiliário, revela que os lançamentos do segmento de luxo e superluxo em São Paulo, de janeiro a setembro de 2021, somaram 4.217 unidades – um aumento de 129% em relação a igual período do ano passado e o dobro da expansão da construção como um todo. Hoje, a fatia desses lançamentos na cidade é de 8,5%, ante 5,8% do ano passado. É uma participação historicamente alta: o recorde anterior, de 7,8%, havia sido registrado em 2019.
O valor geral de vendas desses imóveis de luxo atingiu R$ 9,4 bilhões até setembro, quase dobrando o valor do mesmo período do ano passado. Em reais, a participação da altíssima renda chegou a 37,5% no acumulado de 2021 – outra marca histórica.
Mas, afinal, o que diferencia o “luxo” do “superluxo”? O setor trabalha com faixas de preço, explica Fabio Araujo, sócio da consultoria Brain. Os imóveis residenciais de luxo para o mercado de São Paulo são aqueles negociados acima de R$ 1 milhão; já os de superluxo, acima de R$ 2 milhões.
A estimativa, de acordo com o executivo, é de que os prédios de luxo sejam acessíveis para cerca de 5% da população brasileira, ao passo que os de alto luxo são restritos ao topo da pirâmide – um sonho atingível apenas pelo 1% mais rico.
No entanto, os apartamentos mais disputados entre os milionários paulistanos custam, em média, R$ 5,1 milhões, ou R$ 21,7 mil por metro quadrado, aponta a Brain. O tamanho médio desses imóveis supera os 200 m². Nos apartamentos mais caros da cidade, porém, o metro quadrado chega a valer R$ 63 mil.
O forte crescimento desse filão do mercado, especialmente dos de luxo, segundo Araújo, deve-se a uma equação formada pelo efeito da pandemia, que fez famílias buscarem imóveis maiores. Além disso, em 2020 a taxa de juros bateu na mínima histórica, fazendo as famílias mais abastadas repensarem seus investimentos, o que levou muita gente a comprar um imóvel novo.
Com a alta dos juros, porém, a festa pode estar no fim. “Na conta desse público, ao contrário do que ocorre na classe média, em que os juros afetam a decisão de financiamento, o que muda para eles é se vale a pena fazer outro tipo de investimento”, diz o especialista.
Na capital, 13 edifícios cobram mais de R$ 60 mil pelo metro quadrado
Com valores finais que superam R$ 15 milhões, a capital paulista tem hoje 13 empreendimentos que cobram mais de R$ 60 mil pelo metro quadrado de um apartamento. Essas unidades estão concentradas em bairros nobres como Jardins, Vila Nova Conceição e Moema, segundo a consultoria Brain.
As empresas veem esses empreendimentos como “objetos do desejo”. “Esse cliente é viajado, frequenta ótimos hotéis e espera uma sensação e experiência em tudo o que consome”, diz o diretor de incorporação e negócios da Cyrela, Piero Sevilla. Em um dos empreendimentos da marca, em Moema, a assinatura será do Yoo Studio, escritório de design europeu, fundado por Philippe Starck e John Hitchcox. “Isso tem dado muito certo. Começamos em 2013 com prédios assinados. E a resposta tem sido muito boa.”
Sevilla, da Cyrela, diz que esse cliente também busca flexibilidade: hoje, a construtora já oferece dez modelos de plantas para uma mesma unidade, todas desenhadas pelo arquiteto responsável pelo empreendimento.
A Gafisa, que tomou a decisão estratégica de se voltar ao setor do altíssimo padrão, também seguiu o caminho de lançar o “cobranded”. O primeiro foi no bairro dos Jardins, com a grife italiana Tonino Lamborghini. “É uma marca que traz muito design e life style. Há um valor associado”, afirma o presidente da Gafisa, Guilherme Benevides.
Mas foi no Rio de Janeiro que a companhia bateu um marco no setor, ao cobrar R$ 100 mil o metro quadrado em um apartamento no Leblon – ou quase R$ 30 milhões.
Diretor executivo de incorporação da Even, companhia voltada ao alto padrão, Marcelo Dzik diz que hoje o alto padrão pede plantas mais abertas, áreas mais arejadas e com luz natural em abundância. Fora isso estão sempre presentes nos projetos arquitetos e decoradores renomados.
O presidente da construtora Setin, Antonio Setin, aponta também o fator localização. Com terrenos em regiões mais nobres cada vez mais escassos, os custos de incorporação vêm subindo. Setin vê ainda uma novo perfil de compradores a ser cobiçado: “Vemos alguns jovens ficando ricos cada vez mais cedo, muito fruto da área de tecnologia e fintechs.”
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