Antes que o pensamento perca o seu vigor

Nossa reflexão, vem de longe dessa vez, mas não um longe qualquer, é algo muito perto de nós nesses dias atuais em que endeusamos em demasia os meios tecnológicos, isso prova que ao menos para certas coisas eles prestam, trazemos para o público em geral a figura do já lendário e centenário filósofo e sociólogo, Edgard Morin, uma figura que a cada dia que passa nos brinda com profundas reflexões, atuais, por vezes sombrias, mas também um homem carregado de muitas esperanças em relação a humanidade; no último dia 24/01/2024, ele publicou no jornal italiano “La Repubblica”, o artigo “A resistência do espírito”, onde descreve sua inquietação diante dos rumos que a humanidade vem tomando nos últimos tempos; aquilo que parecia ser a salvação para muitos, tem se tornado agora doenças de várias matizes, nós apostamos demais em “deuses”, que nos deixaram na mão.

Mas quem é o centenário Edgard Morin? É um parisiense, nascido em 08/07/1921, pessoa complexa, pois passou por quase tudo o que a vida pode mostrar a uma pessoa, pouquíssimas coisas durante o século XX lhe foram encobertas, no mais assistiu praticamente tudo de perto, sentiu na pele as baixezas mais inomináveis que os seres humanos podem praticar para os seus semelhantes, na Segunda Guerra Mundial lutou contra a nação intelectual mais poderosa, a Alemanha. Pelos diversos campos em que tem passado, Morin alega sempre que a complexidade veio para ficar, jamais seremos de todos acabados em qualquer dimensão e que o mundo atual, apesar de ser estrondosamente tecnicalizado, não esconde as suas portentosas fragilidades; fatalista ou não, Edgard Morin mostra a todos, o quanto é importante estarmos atentos aos inúmeros sinais da história. 

Nos últimos anos Morin tem se detido nas diversas guerras que estão ocorrendo no Planeta, duas em especial lhe chamam mais a atenção, ou seja, Rússia e Ucrânia e israelenses e árabes, episódios que tem dividido o mundo sob muitos aspectos, para Morin, não resta dúvidas que em ambos os casos, o desenvolvimento e aplicação de novas armas de guerra tem sido um campo fértil, a morte em grande escala industrial volta a ser uma preocupação extrema e a repetição de um passado não muito longínquo. No centro dessas carnificinas se encontram três potências que a todo custo querem dominar o mundo (Estados Unidos, Rússia e China), sem se importarem o que tem feito ao restante da humanidade; esses três países causaram muitas rupturas, provocaram inúmeras carências, não só eles, mas especialmente eles, estão sim por detrás da imensa policrise planetária.

O que se entende por policrise? Nada mais é do que uma crise se alimentando de outra e assim sucessivamente, assim a crise ecológica gera a crise ambiental que por sua vez gera uma crise financeira, que acaba levando todos a uma profunda crise antropológica e existencial. Quanto mais temos buscado o desenvolvimento e o crescimento, mais a tensão tem sido o grande motor de inúmeras confusões e distúrbios individuais e coletivos. Quantas poluições, quantos desequilíbrios sociais estão bem a nossa frente; a sonhada globalização está aí, erodindo-se por todos os lados, incapaz de dar respostas básicas para todos e a Organização das Nações Unidas nunca na sua história esteve tão desunida como agora e a democracia, não é e nunca foi democrática como alguns pensam, hoje mais do que antes ela corre perigos, frágil, está cambaleante, ao sabor de vários ventos autoritários.

Bioeticamente, a figura gigante do centenário Edgard Morin, nos deixa inquietos por muitas razões, antes de mais nada ele pede que aceitemos as incertezas, que o inesperado é sempre possível e que o provável não é certo. Não podemos ficar cegos, surdos e mudos ao que está acontecendo em todas as partes e que afeta tudo e todos, diante de tantas desesperanças que nos são propostas precisamos resistir com a força do pensamento e da ação restauradora. Morin pede também um olhar mais atento àquilo que se chama progresso, pois esse disfarçado de benesses tem sido um grande vilão, é o progresso que tem nos trazido retrocessos, foi o progresso que culminou na Segunda Guerra Mundial, Auschwitz, Hiroshima e Nagasaki; é o progresso altamente complexo cada vez mais que nos tem tornado fracos, somos constantemente dominados e pensamos que estamos livres. 

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