Carta Apostólica Desiderio desideravi

Judinei Vanzeto

No dia 29 de junho, Solenidade de São Pedro e São Paulo, no Vaticano, o Papa Francisco publicou a Carta Apostólica Desiderio desideravi sobre a formação litúrgica do povo de Deus. Em 65 parágrafos, o texto procura recordar o significado profundo da celebração eucarística e convida para uma formação litúrgica.

Segundo resenha do documento publicada por Vatican News, não se trata de uma nova instrução ou de um diretório com normas específicas, mas sim de uma meditação para compreender a beleza da celebração litúrgica e o seu papel no evangelizar. E é concluída com um apelo: “Abandonemos as polêmicas para ouvirmos juntos o que o Espírito diz à Igreja, mantenhamos a comunhão, continuemos a nos maravilhar com a beleza da liturgia” (65).

O documento aborda a necessidade de encontro com Jesus vivo. “A Liturgia nos garante a possibilidade de tal encontro. Não precisamos de uma vaga recordação da Última Ceia: temos necessidade de estar presentes nessa Ceia”. Ainda o Papa acrescenta: “Gostaria que a beleza do celebrar cristão e de suas necessárias consequências na vida da Igreja, não fosse deturpada por uma superficial e redutiva compreensão de seu valor ou, pior ainda, de sua instrumentalização a serviço de alguma visão ideológica, seja ela qual for”(16).

Também adverte sobre o “mundanismo espiritual” e o gnosticismo e neopelagianismo que o alimentam, Francisco explica que “participar do sacrifício eucarístico não é uma conquista nossa como se pudéssemos nos orgulhar disso diante de Deus e de nossos irmãos” e que “a liturgia nada tem a ver com um moralismo ascético: é o dom da Páscoa do Senhor que, acolhido com docilidade, renova a nossa vida. Só se entra no Cenáculo pela força da atração de seu desejo de comer a Páscoa conosco”(20).

Para curar do mundanismo espiritual é preciso redescobrir a beleza da liturgia, mas essa redescoberta “não é a busca de um esteticismo ritual que se compraz apenas no cuidado da formalidade externa de um rito ou se satisfaz com uma escrupulosa observância de rubricas. Obviamente, esta afirmação não quer de modo algum aprovar o comportamento oposto que confunde a simplicidade com desleixada banalidade, a essencialidade com uma ignorante superficialidade, a concretude do agir ritual com um exasperado funcionalismo prático”(22).

Ressalta que “cada aspecto do celebrar deve ser cuidado (espaço, tempo, gestos, palavras, objetos, vestes, canto, música) e cada rubrica deve ser observada: bastaria essa atenção para evitar privar a assembleia do que lhe é devido, ou seja, o mistério pascal celebrado na modalidade ritual que a Igreja estabelece. Mas mesmo que se garantisse a qualidade e a norma da ação celebrativa, isso não seria suficiente para tornar plena nossa participação”(23). Ainda reitera que se faltar “o encanto pelo mistério pascal” presente “na concretude dos sinais sacramentais, poderíamos correr o risco de ser impermeáveis ao oceano de graça que inunda cada celebração” (24).

Na Carta, Francisco afirma que, sem formação litúrgica, “as reformas no rito e no texto não ajudam muito” (34). Ele insiste na importância da formação, especialmente nos seminários: “Uma abordagem litúrgico-sapiencial da formação teológica nos seminários certamente teria efeitos positivos também na ação pastoral. Não há aspecto da vida eclesial que não encontre nela seu ápice e sua fonte. A pastoral de conjunto, orgânica e integrada, mais do que o resultado de programas elaborados, é a consequência de colocar a celebração eucarística dominical, fundamento da comunhão, no centro da vida comunitária”(37).

Chama a atenção no tocante a criatividade selvagem e imaginativa que perde a compreensão dos símbolos. Entre os gestos rituais que pertencem a toda a assembleia, o silêncio ocupa um lugar de absoluta importância”, que “move ao arrependimento e ao desejo de conversão; suscita a escuta da Palavra e a oração; dispõe à adoração do Corpo e Sangue de Cristo” (52).

Nesta esteira “presidir a Eucaristia é mergulhar na fornalha do amor de Deus. Quando nos é dado compreender, ou mesmo apenas intuir, esta realidade, certamente já não precisamos de um diretório que nos exija um comportamento adequado” (57). Enfim, a Igreja possui uma riqueza insoldável entorno da Eucaristia que ainda precisa ser redescoberto.

Jornalista e pároco da Paróquia São Roque de Coronel Vivida e gestor do Polo Unilassale/Fapas

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