Morrer é ir sozinho para a estrada

Quem se despede deve fazer as malas pela última vez. Escolher o que levar definitivamente. Se já somos indecisos em uma pequena viagem ou num frete para uma casa nova, imagine quando a viagem significa uma mudança de alma, separar só o essencial do essencial, só o básico do básico, só a felicidade realmente honesta.

Centrados em nossa dor, embargados pelo choro, não paramos para pensar no que representa essa passagem difícil e única: guardar as palavras de gratidão, eliminar a culpa e o ressentimento, deixar de lado tudo o que não vai mais acontecer, desapegar-nos de quem mais amamos e acreditar que cada um que ficou tem condições de dar conta do recado sem a nossa ajuda.

O certo é que aqueles que ficam não devem parar de rezar. Não é porque a pessoa morreu que a reza termina. Não cesse a oração. Para que ela chegue segura à paz. Para que nunca fique perdida na memória. Para que seja incentivada pela saudade a conseguir perfazer a longa travessia de adeus ao corpo, às cicatrizes, às marcas do destino. Transfira a mentalização positiva que antes era pela recuperação da sua saúde para que ela encontre o descanso.

Não a abandone porque ela não está mais aqui. Ainda precisa de você para sair do tempo dos relógios, para tirar os sapatos da preocupação. Permita-se confiar naquilo que não entende. Não cobre mais nada: ela é agora perfeita em suas imperfeições, cumpriu a sua missão.

A dor da perda é como uma panela de pressão. Não podemos abrir na hora em que uma chama em nossa vida se apagou. É necessário liberar o vapor aos poucos. Para não sermos queimados pela alta temperatura da saudade. Quem tenta descerrar a tampa logo que um falecimento acontece pode explodir a esperança, a fé, a confiança em Deus e em si mesmo. Temos que respeitar a trava de segurança. A fumaça que virá primeiramente é a do susto, do choque. Você não acreditará que não poderá mais ver ou conversar com quem recentemente se mostrava acessível. Passará a caminhar para trás, recuando ao passado, para proteger a memória, lembrando detalhes que nem julgava possuir.

O derradeiro ciclo da panela de pressão é o da gratidão, no momento em que você revive os conselhos e lições herdadas. Já não reclama da precocidade dos laços, não acha que foi um engano, não mais amaldiçoa ninguém, não se sente injustiçado. Reconhece a herança perene em sua personalidade, um jeito de rir ou de se portar parecido com o daquele que se foi. O sofrimento não tem atalhos. É sair da estrada e abrir um novo caminho de aceitação na mata fechada. A despedida nos ensina a dura lição de comemorar o nascimento em vez de unicamente lamentar o fim.

É hora de seguirmos o caminho das flores que retribuímos aos nossos mortos. Flores de amor eterno que transformam nossas lágrimas em altares de morte/vida/ressurreição na eternidade no tempo, no amor e no perdão.

Pe. Lino Baggio, SAC

Paróquia São Roque – Coronel Vivida

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