Os governistas terão 34 senadores, empatados com a oposição. São quatro senadores de partidos regionais, dos quais dois são aliados da Casa Rosada. A maioria, porém, é de 37, o que obrigará o governo de Alberto Fernández a negociar tudo. Isso inclui o Judiciário.
A Justiça e os partidos políticos têm uma relação promíscua na Argentina e o ritmo dos casos de corrupção acaba sendo determinado pelas urnas. Desde 2019, muitos processos foram suspensos, aumentando a sensação de impunidade. Agora, há sinais de mudança.
Perder o comando do Senado equivale no sistema argentino a perder o controle ou ter menor influência sobre juízes de todas as instâncias. Daniel Sabsay, presidente da Associação de Direito Constitucional e um dos mais importantes juristas do país explicou ao Estadão a razão desse fenômeno.
“Os juízes federais argentinos decidem em favor de quem está no poder. Desde as eleições, há indícios de que eles vão acelerar os casos de corrupção de Cristina”, disse Sabsay. “É provável que isso aconteça, porque os magistrados sentem uma grande chance de a oposição ganhar as eleições presidenciais de 2023.”
A dependência que os juízes têm do poder, segundo Sabsay, tem relação com a composição do Conselho da Magistratura, cujos membros são escolhidos pelo Congresso, pelo presidente, por advogados e magistrados. “Mas a Constituição não define quantos representantes cada um escolhe. Assim, o kirchnerismo aproveitou a brecha, em 2006, e modificou a correlação de forças, fazendo com que as indicações políticas chegassem a 7 de um total de 12 magistrados. Assim, a seleção dos juízes ficou nas mãos de líderes políticos”, disse Sabsay.
O Senado também é relevante porque tem poder sobre questões institucionais sensíveis, como a escolha do procurador-geral e dos juízes do Supremo, que definem os julgamentos políticos e o destino dos casos de corrupção. Uma fonte do Gabinete Anticorrupção (espécie de ministério criado pela Constituição), que conhece em detalhes os processos da família Kirchner, disse que o caso mais complicado para Cristina é o Hotesur, de lavagem de dinheiro, que envolve seu filho e sua filha. Outro que pode trazer complicações é o “escândalo dos Cadernos”, trama de suborno revelada pelas anotações de um ex-ministro.
A insatisfação popular e a perda do Senado podem criar um pesadelo para Cristina. Como vice, ela tem foro privilegiado e, em razão de sua estatura política, dificilmente deixaria de ser eleita. Mas o mesmo não se pode dizer do filho Máximo, presidente da Câmara, e muito menos da filha Florencia.
JUIZ ALIADO
A advogada Silvia Martínez, diretora do Observatório Cidadão pela Transparência, que assina a queixa do caso Hotesur, contra Cristina Kirchner, diz que o processo já foi enviado para julgamento oral. “Nele, Cristina não é julgada como presidente, mas como empresária, pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação ilícita. Seus filhos foram indiciados porque suas assinaturas estão em documentos e cheques.”
Até agora, Cristina tem tido a sorte de ter seus processos enviados ao juiz Daniel Obligado, nomeado pelo kirchnerismo. “Ele atrasa os processos e acata os pedidos da defesa”, acusa Martínez. Prova disso, segundo ela, é o que ocorreu há poucos dias: Obligado votou pelo arquivamento do caso Hotesur – junto com outro magistrado -, pouco antes da posse do novo Senado. Foi uma vitória de Cristina, mas não foi definitiva. Como houve apelação, a decisão cabe ao Tribunal de Cassação.
A oposição diz que a perda do controle do Senado impedirá que o governo garanta a impunidade da família Kirchner, que pretendia emplacar uma reforma do Judiciário que multiplicaria os nomes indicados por eles: novos juízes, um novo procurador-geral e novos membros do Supremo. Todas as questões exigem uma maioria, que Cristina não tem mais. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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