Dirceu Antonio Ruaro
Uma das queixas mais comuns nas escolas de ensino fundamental, médio e superior, na atualidade, é a pouca habilidade para construir pensamentos lógicos e coerentes.
Isso é resultado de uma educação muito mais mecânica do que reflexiva, logicamente. Mas, é também, resultado de uma educação familiar muito mais preocupada com a aparência do que com a essência da pessoa.
A educação que deveria ensinar a pensar não se pratica na maioria das escolas, tanto que, ao chegar ao nível superior, chega a ser calamitosa a incapacidade de organizar um texto com coerência. Não estou falando aqui de uma opinião correta ou errada, não é isso. Estou falando de um texto que tenha sentido, início, meio e fim. Um texto que tenha uma evolução argumentativa coerente com a introdução e que seja desenvolvido com argumentos que possibilitem uma conclusão coerente.
Chamo a essa situação educacional de “déficit de pensamento”. E que razões nos levam a essa situação? Ao conversar com um colega de trabalho ouvi isso: “a maioria das aulas que tive foi expositiva. Um professor, normalmente mal pago e por isso mal-humorado, falava horas a fio, andando para lá e para cá. Parecia mais preocupado em lembrar a ordem exata de suas ideias do que observar se estávamos entendendo o assunto ou não. Ensinava-se as capitais do mundo, o nome dos ossos, dos elementos químicos, como calcular o ângulo de um triângulo e muitas outras informações que nunca usei na vida. Nossa obrigação era anotar o que o professor dizia e na prova final tínhamos de repetir o que havia sido dito. Ensina-se a classificação das borboletas, enfim era o mundo da decoreba”
Raramente ensinamos os nossos filhos e alunos a resolver problemas, a não ser algumas questões de matemática, que normalmente devem ser respondidas exatamente da forma e na sequência que o professor quer.
Matemática, estatística, exposição de ideias e português obviamente são conhecimentos necessários, mas eu classificaria essas matérias como ferramentas para a solução de problemas, ferramentas que ajudam a
pensar. Ou seja, elas são um meio, e não o objetivo do ensino. Considerar que o aluno está formado, simplesmente por ele ter sido capaz de repetir os feitos intelectuais das velhas gerações, é fugir da realidade.
Diante disso é preciso entender que existe uma grande diferença entre “conhecer” e “pensar” e parece-se que, tanto a família quanto a escola confundem esses conceitos, imaginando que sejam os mesmos.
Conhecer consiste na acumulação de ideias, de informações. O conhecimento permite, quando muito, a elaboração de teorias e a resolução de problemas técnicos.
Pensar vai muito além, pois permite vasculhar o mais recôndito da alma da pessoa, permite distinguir o bom do mau, o verdadeiro e o falso, o belo e o feio. Permite manter um diálogo interior, refletir criticamente sobre as nossas próprias ações e suas complexidades.
Pensar exige silêncio interior, empatia e sensibilidade para podermos nos colocar na pele dos outros e compreender os desígnios das pessoas e do mundo que as rodeia.
Infelizmente, parece que o hábito de pensar, de ensinar a pensar é muito raro. Interessante observar que na primeira infância, muitíssimas vezes as mães e professores colocam a criança que fez alguma “arte” no “cantinho do pensamento”.
Muitas crianças aprenderam a pensar no cantinho do pensamento. Mas não é essa a nossa defesa. Nossa defesa é que as famílias e as escolas, em todos os níveis e graus possam ensinar a pensar, a avaliar a realidade, a refletir criticamente, a ter capacidade de introspecção, capacidade de empatia, criatividade, sensibilidade para a realidade, o que implica um processo de procura de sentido para as coisas que acontecem.
Em outras palavras, a educação, tanto familiar quanto escolar deveria procurar um sentido mais humanista, mais de compreensão de si e dos outros, do sentido das coisas, uma educação que provoque o protagonismo, fazendo com que a criança, o jovem e o adulto não sejam espectadores de si mesmos ou um observador passivo de sua própria vida.
Ensinar a pessoa a pensar por si própria, a buscar o sentido das coisas e da própria vida. Por isso, se o professor desenvolver no seu aluno, em primeiro lugar, o homem de entendimento, depois, o homem de razão, e, finalmente, o homem de instrução. Este procedimento tem esta vantagem: mesmo que,
como acontece habitualmente, o aluno nunca alcance a fase final, terá mesmo assim beneficiado da sua aprendizagem. Terá adquirido experiência e ter-se-á tornado mais inteligente, se não para a escola, pelo menos para a vida, conforme o filósofo Immanuel Kant.
Não é uma tarefa fácil, pois tanto os pais, quanto as escolas e a sociedade esperam uma educação imediatista, esquecendo-se de que a educação não pode ser apenas técnica, ensinar a fazer, mas precisa ensinar a pensar para apender como fazer, pense nisso enquanto lhe desejo boa semana.
Doutor em Educação pela Unicamp, Psicopedagogo Clínico-Institucional
Pró-Reitor Acadêmico Unimater
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