Neto de Telê quer criar memorial para resgatar legado de futebol deixado pelo avô

Em 1982, na Espanha, ele encantou o planeta com uma seleção que não ganhou a Copa, mas segue reverenciada por seu futebol mágico. Dez anos mais tarde, comandou o ciclo mais vitorioso da história são-paulina culminando com o bicampeonato mundial. Símbolo maior do futebol-arte praticado no Brasil, e intimamente ligado a clubes como Fluminense, Atlético-MG e São Paulo, Telê Santana deverá ter o seu legado reunido e organizado por meio de um memorial que está sendo planejado no seio familiar. Diogo Tenuta, filho de Renê Santana, vem tomando frente nessa iniciativa para resgatar a história do avô famoso. Já existe um projeto em fase de negociação com a prefeitura de Itabirito, que inclui ainda a reativação de um Instituto que leva o nome do treinador.

Em entrevista ao Estadão, Diogo se colocou como um ajudante nesta tarefa e divide as ações com o pai, Renê. “O local já está praticamente definido. Temos um acervo muito grande com peças que incluem uniforme, autógrafos, troféus, medalhas e até um carro, uma Pajero, que meu avô usava nos tempos de São Paulo. Tem ainda recortes de revistas e até camisas do Fluminense, time que defendeu durante a década de 50”.

Ainda segundo ele, já está em fase de estruturação um projeto de Lei de Incentivo à Cultura. “Queremos fazer uma coisa bem tecnológica para atrair não só a população da cidade, mas também os turistas. Tem muita coisa interessante que os mais jovens gostariam de saber”.

INSTITUTO TELÊ SANTANA – Além do memorial, outro assunto em pauta com a prefeitura é a reativação do Instituto Telê Santana. Esse projeto havia sido lançado em 2011, pelo seu pai, e tinha sede em Belo Horizonte. No entanto, a iniciativa acabou não vingando. “Foram poucos projetos. A falta de experiência na execução das coisas acabou atrapalhando”.

Dessa vez, no entanto, Tenuta pretende fazer o instituto funcionar. Com metas fixas, ele pretende unir esporte e educação e também explorar o que chama de bilinguismo. “Queremos usar o esporte como ferramenta de inclusão para a educação das crianças. Reforçar o aprendizado do inglês. Esse sempre foi um sonho do meu pai.”

Raphael Randow, secretário de Esportes e Lazer da cidade mineira, falou que as reuniões vêm sendo produtivas. “A prefeitura está propensa a ofertar o local tanto para o memorial, quanto para o instituto. Queremos criar parcerias, convênios e termos de compromisso para que tudo isso se opere.”

PANDEMIA – A data de 90 anos do nascimento de Telê não deve ter uma comemoração especial por parte da família. Os motivos são os protocolos de segurança que os familiares preferem adotar para evitar aglomerações e não correr nenhum tipo de risco com o contágio do novo coronavírus.

“Não tomamos a iniciativa de fazer nenhum tipo de celebração né. Com essa pandemia não é aconselhável fazer nada. O São Paulo nos procurou e talvez faça algo. Não sei ao certo.”

DE GOLEIRO FRUSTRADO A ESTÁTUA NA CIDADE – Morador da cidade, o jornalista Vinícius Dias conhece a fundo a trajetória do filho ilustre do município. De acordo com ele, Telê, quando menino, queria jogar no gol por influência do pai Zico Lopes, que fora goleiro do América-MG. “Mas após sofrer 13 gols em um jogo pelo Itabirense, ele nunca mais quis saber da posição”, afirmou Dias ao Estadão.

Anos mais tarde, já atuando no ataque, o promissor jogador defendeu também o União e o Usina Esperança e se tornou um dos grandes destaques do futebol local.

A cidade tem ainda uma estátua em tamanho real do treinador. Na escultura, ele aparece segurando uma bola que tem escudos dos times em que se destacou na carreira. Atlético-MG, São Paulo e Fluminense estão registrados na obra.

NETO SEGUE OS PASSOS DO AVÔ – A máxima “filho de peixe, peixinho é” cabe bem para ilustrar a vida profissional de Diogo. Aos 39 anos, ele segue os passos do avô famoso. E seu projeto de vida é se consolidar como técnico.

“Eu nasci em 1982. Quando ele viveu aquele apogeu no São Paulo, eu tinha dez anos e me lembro muito bem. Minhas referências são todas dele, não tem como negar. A exigência, o profissionalismo, a disciplina, o perfeccionismo. A metodologia de trabalho é muito parecida. A história dele é a minha escola”, afirmou.

Com larga experiência internacional, Diogo trabalhou na Itália e em Portugal. Nesse período alternou suas atividades nas funções de técnico e auxiliar. Ele passou ainda dois anos no Barcelona, time que esteve perto de levar Telê pouco antes de ele adoecer. “Meu avô e o Cruyff tinham uma relação de admiração recíproca”.

Há 14 anos fora do país, Tenuta tem licença B da Uefa e pretende alçar voos mais altos. “A vida de auxiliar não me satisfaz. Tenho personalidade de técnico e tenho as minhas ideias. Desde 2014, quando decidi ser treinador, tenho buscado conhecimento que possa agregar na minha trajetória”, concluiu.

LEGADO DO INÍCIO AO FIM – Entre os muitos títulos conquistados em sua vasta trajetória como treinador, dois ciclos sempre foram considerados especiais para o próprio Telê. O do Atlético-MG, no início dos anos 70, e o do São Paulo, na primeira metade da década de 90.

Autor do gol que deu o Campeonato Brasileiro para o time mineiro em 71, Dario falou do carinho e respeito que tem pelo técnico. “Para mim, ele é o maior técnico brasileiro de todos os tempos. Aquele foi o primeiro título de expressão do Telê. Ele me transformou numa máquina de fazer gols. Enquanto as pessoas riam de mim, ele me pegava e colocava para treinar. Cabeceava mais de 50 bolas por treino. Chutava com a esquerda e a direita até cansar. O resultado está aí. Dadá o terror dos zagueiros.”

Dario lembrou ainda de uma conversa que teve com o treinador que foi em sua trajetória. “Ele disse que nos anos 50, o Fluminense tinha um jogador chamado Waldo que ele era caneludo. Mas fazia gols como ninguém. Falou que iria me transformar num novo Waldo e eu virei esse artilheiro impiedoso”, comentou.

No São Paulo dos anos 90, a experiência de Telê transformou o time do Morumbi no melhor do mundo por duas temporadas seguidas. “Eu me orgulho de ter sido um dos atletas que mais vezes foi comandado por ele: quase 400 jogos. O Telê faz muita falta. É símbolo de futebol bem jogado, de qualidade no toque de bola. Sem dúvida, é uma figura das mais importantes na história são-paulina”, afirmou o ex-goleiro.

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