Onde homens e natureza se encontram

Pato Branco:A saga de construir a cidade mais sustentável do Paraná, novos horizontes de crescimento apresentam um desafio, sem ignorar os limites do ecossistema e ao mesmo tempo, encontrar condições saudáveis de vivência do/no espaço urbano

luiz Felipe Panozzo

“Enquanto o homem continuar a ser destruidor impiedoso dos seres animados dos planos inferiores, não conhecerá a saúde nem a paz. Enquanto os homens massacrarem os animais, eles se matarão uns aos outros”. Pitágoras, em sua afirmação nos faz refletir: para viver em harmonia com o ecossistema que nos rodeia, é necessário modificar alguns costumes destrutivos e massacrantes. O filósofo e matemático grego viveu cerca de 2500 anos atrás, porém, com olhar futurístico conseguiu exprimir as diretrizes da relação amigável do ser humano com o que lhe rodeia, para manter uma vida de paz.

A história de nossa cidade nos remete aos idos da década de 1950. Florestas gigantes e “infinitas” de araucárias fizeram os olhos de muitos madeireiros brilharem para o sudoeste do Paraná. Um dos nossos primeiros ciclos econômicos foi o madeireiro, que contribuiu entre outras coisas, para que hoje o município tenha aproximadamente 70% de suas áreas desmatadas. É claro que o desmatamento desenfreado como ocorreu naquela época, não existe na atualidade. Porém, “a Terra sempre manda seus boletos e eles vão chegar”, dizia um radialista de Pato Branco em seu programa matinal, ao se referir às chuvas excessivas, registradas no mês de outubro de 2022. Os problemas ambientais que nossa cidade herdou como consequências do crescimento rápido, são verdadeiras visões proféticas de um futuro, por vezes pior, caso nenhuma atitude seja tomada com eficiência e urgência.

Agora, com os 70 anos completos do Município de Pato Branco, é possível tal como Pitágoras, olhar para o futuro e desenhar uma cidade em harmonia com o meio ambiente e estabelecer comportamentos que nos levem até lá? Para responder essa pergunta, o Diário do Sudoeste conversou com o secretário de Meio Ambiente, Vitor Debastiani e com a engenheira ambiental Keli Starck, para estabelecermos juntos uma imagem de como será o meio ambiente de Pato Branco daqui 30 anos, em 2052.

Projeto de Parques Urbanos

No planejamento de Parques Urbanos, Keli e Vitor são unânimes em citar a necessidade de preservar o que existe. Como alguns dos parques urbanos: Parque Municipal Córrego das Pedras, Parque Municipal do Lago Azul, Parque Municipal Cecília Cardoso e o Parque Estadual Vitorio Piassa – Parque do Alvorecer. No início, e segundo o secretário, a base para construção de um Pato Branco para décadas a frente é olhar também para o futuro destes parques. “Nós temos três projetos em andamento para que nós proporcionemos não só a preservação, mas também espaços de lazer de contato da população com o meio ambiente. Então, já existem três espaços que pretendemos no futuro, fazer esses parques. Um deles, no São Francisco, já está com projeto em andamento”, conta o secretário.

Porém, a cidade cresce em ritmo acelerado. Somente no Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM), hoje, Pato Branco ocupa lugar de destaque. Na última década conseguiu subir 32 posições no índice, para atualmente ocupar a quarta colocação do Paraná. O que pode auxiliar na preservação e colocar os projetos de outros três parques urbanos em prática é o projeto para aumentar arrecadação, através do ICMS Ecológico. A engenheira ambiental Keli Starck, categoriza a ferramenta como proeminente para chegar ao objetivo do Município com a Secretaria de Meio Ambiente, qual ela já chefiou. “O ICMS Ecológico é um relevante instrumento de política pública que recompensa os municípios pela restrição de uso do seu território. Trata-se, portanto, de um remanejamento de receita tributária, baseado na proteção ambiental realizada no Município. Desta forma, a elevação do valor dependerá do comprometimento com a preservação das Unidades de Conservação [parques urbanos]”, explicou Keli.

Parque Estadual Vitorio Piassa – Parque do Alvorecer foi inaugurado em 2018 – Crédito: Rodinei Santos/PMPB

Dinheiro é a solução dos problemas?

O tal imposto ecológico, remanejado como benefício ao município que preservar suas áreas verdes também está nos projetos futuros da Secretaria de Meio Ambiente. O projeto é simples: em 10 anos, Vitor afirmou que o Município tem plenas condições de sair dos R$ 160 mil por ano de ICMS Ecológico para R$ 1,5 milhões. Isso, se os gargalos do tempo, em especial nos parques já existentes e mananciais, sejam preservados. “O nosso projeto é de aqui 10 anos estar recebendo mais de R$ 1,5 milhão de ICMS Ecológico. Isso é muito viável, é só o Município fazer o que não foi feito ainda. Buscar áreas, ver quais as possibilidades dessas áreas, quais os investimentos que precisamos fazer nos parques que já existem – e que pontuam para isso, que muito não foi feito, então a gente tem que pensar nessa reformulação, por exemplo o Parque Córrego das Pedras, do bairro Jardim Primavera, é um parque a gente precisa investir, porque ele também nos dá valor de ICMS Ecológico”, explica Vitor.

O dinheiro de um remanejamento tributário para o município, não cobre para a Pato Branco centenária, daqui 30 anos, os investimentos necessários para, por exemplo, realizar o planejamento já existente da Secretaria, de criar outros três parques urbanos. Os olhares, aqui então, devem ser em fontes diversas.

Um plano para o rio que passa por aqui

Umas dessas fontes de informação é o esperado Plano Diretor revisado e atualizado, complementado por análises realizadas. Um exemplo é o estudo, a pedido do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo (Gaema) do Ministério Público Estadual (MPPR), que a Prefeitura de Pato Branco teve que realizar e que possibilitará estruturar a ocupação do território, já escasso, do município. Saberemos de uma vez por todas onde mora a divisão, muitas vezes não respeitada, entre humanos e sua “selva de pedra” e a natureza frágil para alterações e escomunal para reivindicar seu espaço.

“Ele [o estudo] já mostrou para nós, que devemos diminuir a ocupação. Então creio que isso vai nos ajudar muito, baliza a questão da Defesa Civil, para que tenhamos um controle maior sobre essas áreas”, revela Vitor, que comentou sobre a possibilidade do Plano Diretor revisado auxiliar em momentos de grandes chuvas. “Também quando tem grandes chuvas que podem ocasionar deslizamentos, porque nós precisamos ter um controle muito grande sobre isso, para que a população não venha ser prejudicada, e para que tenhamos áreas que possibilitem a expansão do município, mas que sejam áreas adequadas para isso”.

Estabelecer limites salutares aos agentes do ecossistema, homem e natureza, pode ser utópico – visto a força anteriormente citada da natureza e a velocidade do avanço urbano – porém um objetivo a ser colocado como alvo para construir uma cidade centenária que respeite o meio ambiente. “Deve-se ponderar que o Plano Diretor é um estudo científico e aprofundado sobre a cidade, cujos resultados — estabelecidos no curto, médio e longo prazo — só poderão ser visualizados caso haja um cumprimento efetivo do que foi proposto”, comenta Keli sobre a real utilização de um Plano Diretor atualizado. O projeto para os próximos 30 anos é que Pato Branco cresça sob orientação de um documento atualizado, para que não esqueça de que um dia deixou moradores ilhados ou, até mesmo, levou todos os seus pertences através das correntezas.

“A principal questão é a revisão do Plano Diretor. Nós precisamos dessa atualização o quanto antes, para que aproveitando esse estudo que foi feito, possamos repassar à população quais as áreas que estão a disposição [para construções urbanas], quais as áreas de vazio urbano, qual área que não pode e qual área que tem risco. Por isso da urgência nessa aprovação, na realização de audiências, para repassar todas essas informações”, ressalta Vitor.

Limpeza do Córrego das Pedras, no bairro Jardim Primavera em 1996 – Crédito: Arquivo Diário do Sudoeste
 
Ação de limpeza de rios em novembro de 2022 – Crédito: Assessoria PMPB

Uma corrente verde que protege rios e casas

Outra fonte diversa de preservação de áreas verdes já existentes é a possibilidade de criar parques lineares, segundo o que projeta a Secretaria de Meio Ambiente. Um plano estratégico de criar ligações verdes entre espaços a longo prazo [15 a 30 anos] e com um custo considerável de investimento.

O objetivo é reformular a utilização dos espaços verdes. Não apenas para proteção de nascentes, ou exclusivo para uso do lazer da comunidade. Unificar o uso e adicionar sentimento de pertencimento aos parques urbanos da atualidade. Segundo o secretário, “a ideia é a criação de dois grandes Parques Lineares. Um irá ligar o Parque Cecília Cardoso, no bairro Bonatto, até o parque do Lago Azul, no bairro Gralha Azul. O outro parque, inicia no bairro Planalto onde tem a nascente do Córrego Penso, que iria até o bairro Vila Esperança, onde existem áreas de alagamentos”.

A funcionalidade dessas grandes áreas verdes é o desafogamento dos rios e suas encostas e na disponibilização de maiores áreas verdes, a exemplo do Parque Estadual Vitório Piassa – Parque do Alvorecer, para que a população faça uso dos espaços para o lazer e também para educação ambiental.

Para a engenheira ambiental, os Parques Lineares são obras desejáveis ao futuro de Pato Branco. “Os parques lineares — que recebem esta denominação por possuírem comprimento maior que a largura — possibilitam a criação de caminhos no cenário urbano, circundando rios, além de funcionar como corredores ecológicos”.

Nestes corredores, estão também hoje em funcionamento uma bacia de contenção, porém, outras duas em fases diferentes e não concluídas. A solução para as enchentes em nosso município passa também por criar proteções verdes nas respectivas bacias, uma espécie de cinturão verde. Outra necessidade que deve ser sanada nos próximos meses conforme a Secretaria de Meio Ambiente, é o processo de desassoreamento da Bacia de Contenção do Pinheirinho. Segundo o secretário, a ideia dos cinturões deve ficar para a Pato Branco centenária, tendo em vista o grande aporte financeiro despendido ao objetivo.

A bola da vez segundo Vitor, são os projetos de funcionalidade das bacias atual e futuras: No Córrego Penso, região do bairro Vila Esperança e a finalização da Bacia do bairro Bonatto. “Mesmo que o Município tenha todo o suporte – que são as bacias – infelizmente se tiver algum lixo que vai parar lá por má destinação, isso causará um problema. É uma conscientização. Precisamos que a população nos ajude na destinação correta dos resíduos”.

Outro espaço que está na rota de crescimento urbano do Município é o Parque de Exposições, com sua área verde de preservação. Segundo planejamento da Secretaria, ele deve continuar suas funções, mesmo com o avanço do espaço urbano.

Parque do Alvorecer, o pulmão da Pato Branco centenária

Os resíduos sejam eles sólidos ou líquidos, em algum lugar serão descartados. Hoje o Município está em fase de transição, e o planejamento é para que o ano de 2024, uma nova Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) seja inaugurada, mais uma vez, seguindo os caminhos do crescimento para a zona Norte. Um problema, principalmente de mau cheiro para a população que povoou nos últimos anos o bairro Fraron, será resolvido. Porém, é necessário um esquema estratégico de construção da rede de tratamento desses resíduos, para que os problemas de hoje não se repitam no amanhã.

Em meio ao desenvolvimento de uma nova cidade dentro de uma que já existe, a Pato Branco centenária terá uma área verde em seu centro. O Parque Estadual Vitório Piassa, conhecido como Parque do Alvorecer, é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral de 107 hectares e segundo planejamento estratégico da Secretaria, “será um pulmão de Pato Branco. Nós já temos alguns estudos da UTFPR [Universidade Tecnológica Federal do Paraná] no parque, temos outras universidades também, e ele só tem a ser cada vez maior, a se tornar um espaço cada vez mais utilizado pela população”. Vitor também comenta sobre a possibilidade de um outro parque ambiental da zona Norte. Ele estará localizado no bairro São Francisco, fazendo ligação da rua Tocantins com a BR-158, na finalidade de criar um local que também resolva os problemas de erosão da área.

A garantia de água na torneira do pato-branquense

Água é vida. Um ser humano em sua forma saudável, segundo a Organização Mundial de Saúde, deve ingerir dois litros de água potável por dia. Ao pensarmos esse número e visualizarmos que o Município que completa 70 anos em pleno 2022, possui apenas um local para extrair água para toda sua população, no mínimo, ficamos preocupados. Como projetar uma saída para garantir água na torneira do cidadão pato-branquense.

O secretário Vitor reconhece que é tempo de pensarmos um suporte para o rio que nos abastece, o rio Pato Branco, com nascente na cidade vizinha, Mariópolis. “Chegou o momento de o Município fazer um trabalho em conjunto com Mariópolis, muito focado na preservação dessas áreas, para que não venhamos sofrer futuramente de escassez de água. O Município precisa retomar isso enquanto pensa qual seria o ponto de suporte para o abastecimento de água do município. A população deve ficar atenta para isso e no cuidado com o futuro dessas áreas que precisam e devem ser preservadas, como por exemplo, as regiões ciliares do rio Chopim, possível suporte ao abastecimento de Pato Branco”.

Keli também delega a segurança hídrica às ações conjuntas. “A segurança hídrica é um conceito cada vez mais presente em nossa sociedade, pois trata de garantir o acesso à água. Neste sentido, o desafio de cuidar, preservar e recuperar os rios – quando necessário – requer ações coletivas”.

Quanto aos rios urbanos, o surrado rio Ligeiro ainda presta seus serviços a comunidade, muito mais de forma educativa. Isso porque, a administração municipal concorda que há necessidade de se aprender com o “afogamento” do rio urbano. Porém, segundo o secretário, dificilmente o rio Ligeiro morrerá. “Sumir ele não vai, porque o Município tem esse pensamento de preservá-lo”.

O que fazer com o lixo de 70 anos e de 30 que estão por vir

Depósito de lixo considerado irregular, na década de 1980 – Crédito: Arquivo Diário do Sudoeste
Aterro sanitário de Pato Branco em 2022 – Crédito: Rodinei Santos/ PMPB

O lixo virou luxo, e em um cenário futurista, a indústria verde e sua implantação deixam de ser uma tendência a ser seguida, para uma necessidade ambiental e econômica.

Para Vitor, a saída no próximo ano, para uma cidade que há anos sofre com a necessidade de espaço correto para a destinação dos rejeitos (lixo) e para o reaproveitamento (reciclável) é a terceirização do serviço.

Ele observa a questão como a mais difícil da pasta e que por conta disso, está desenvolvendo com sua equipe, a terceirização de todo o processo do lixo. Desde a coleta até a separação e encaminhamento do lixo reciclável para a indústria verde.

Pato Branco produziu em 2022, 70 toneladas de resíduos sólidos por dia. É um assunto que preocupa ao visualizar um crescimento populacional dentro da curva que estamos. Um legado é certo, não podemos usar de espaços como este por muito tempo. Depois de 70 anos servindo uma população consumidora, talvez, agora seja o ponto de mudança.

O ponta pé já foi dado, ainda em 2014, com a distribuição de contêineres para os resíduos recicláveis, em 2020 houve a ampliação de número de unidades e agora, em 2022, foi implementado 140 contêineres de resíduo úmido. Sobre a utilização deles, Vitor frisou que, “irá nos ajudar na coleta do lixo e na diminuição, tanto do tempo para essa coleta, quanto para a quantidade de servidores e equipamentos que temos que utilizar para esse serviço”. O caminho de uma cidade sustentável, após os estudos que estão sendo realizados sobre a possibilidade de terceirização ou abandono do uso de aterros sanitários no município, deixa transpassar que muito provavelmente, o aterro de hoje será solo para construções urbanas no futuro e quem sabe, uma terra que volta à sua plenitude frutífera.

Sonhos de um desenvolvimento que respeite o meio ambiente

O desafio da vida é viver de forma equilibrada e o desafio de um sonho é realizá-lo. Para os dois desafios, Pato Branco de 2052 terá que respeitar seus limites. Limite de suas áreas urbanas e verdes. Dos rios e das ruas, onde brincam os peixes e quase no mesmo espaço, os seus habitantes humanos transitam.

Talvez o aniversário de 70 anos seja sim, a oportunidade de virar a chave, da vida consumista para a vida sustentável, na individualidade de cada cidadão. “Sonhamos em tornar Pato Branco uma das cidades mais sustentáveis do Brasil, e esse é o nosso lema. Os benefícios estarão nas indústrias, no comércio e nas casas, então nós devemos trabalhar isso, para que a cidade se torne um modelo mais do que já é, em outros aspectos. Necessitamos preservar mais”, afirma Vitor Debastiani, Secretário de Meio Ambiente de Pato Branco.

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