O outro lado da moeda – como os agricultores veem a Usina Salto Grande

Preocupados com o seu destino após a implantação da usina, moradores questionam Copel sobre modelo e valor de indenização por área; companhia afirma seguir a normativa

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“Perderemos casa, barracão de máquina, armazéns, área de pastagens, açudes. Tudo ficará submerso. Parte de lavoura também”, essa é a fala do agricultor Alcinei Ziger, 43 anos, que reside na comunidade Santo Antônio do Salto Grande, em Coronel Vivida, desde que nasceu. Hoje, mora na propriedade com a esposa e os dois filhos, e conta que a terra, que será totalmente alagada após o empreendimento, já pertenceu a seu pai e, antes, a seu avô.

Qual valor tem a terra que guarda as lembranças de uma geração inteira? Quanto vale o lugar responsável pelo sustento de uma família? Como se calcula o preço de mercado de uma área que bancou os estudos e sonhos dos filhos de um agricultor, que passou a vida trabalhando embaixo do sol para conseguir seu salário? Como os matemáticos fazem essa conta? É por meio de alguma fórmula, segue uma normativa padrão ou se leva em conta a vida de gerações? Essas são algumas das perguntas que as famílias lindeiras do rio Chopim fazem todos dias, desde que a Copel lhes informou que logo, logo tudo ficará abaixo d’água.

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De um lado, a Copel diz que a única forma de indenização das famílias é por dinheiro, seguindo as normativas da empresa. De outro, agricultores questionam o porquê não pode haver outra maneira, como o reassentamento ou as cartas de créditos.

Preocupação latente: Para onde irão

Esse confronto de ideias deixa os futuros desabrigados preocupados, uma vez que, segundo eles, mesmo recebendo a indenização, o valor pode não ser o suficiente para comprar outro pedaço terra com a mesma metragem e qualidade produtiva. E aí é que está o problema. Onde irão as pessoas que sempre viveram da agricultura, quando não conseguirem comprar outra propriedade? Para a cidade? Começarão do zero?

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Para o agricultor Ziger, com o pagamento somente em dinheiro não é possível saber se conseguirão comprar outro pedaço de terra próximo da onde já vive. “Isso não é levado em consideração pela companhia. Com certeza muitas dessas pessoas, que só sabem trabalhar no campo, acabarão indo morar na cidade, não tendo uma oportunidade de vida digna pela falta de qualificação”, comenta o agricultor preocupado. “A Copel se preocupa com diversos estudos, mas esqueceu do assunto principal: as vidas humanas”.

Famílias impactadas com o empreendimento

Conforme dados da Copel, após a construção da Usina Hidrelétrica Salto Grande, 115 famílias serão impactadas com o empreendimento — 37 são de Pato Branco e outras 78 de Coronel Vivida. De acordo com a companhia, 11 servirão de alagamento de cota máxima.

No entanto, os agricultores do lado de Coronel Vivida, com quem a reportagem do Diário do Sudoeste conversou, questionam o número. “Só estão contando como atingidos os proprietários de terra. Não contam se tem duas famílias morando na mesma propriedade e também desconsideram para o cálculo arrendatários, posseiros, meeiros e funcionários das áreas, que serão atingidos e também sofrerão impactos pois, perderão o trabalho”, explica Ziger.

De acordo com a assessoria da companhia, o número divulgado é apenas de propriedades, não famílias. “O número de famílias/pessoas vinculadas diretamente à propriedade será levantado durante a realização de um cadastro socioeconômico, na fase posterior do projeto, após a obtenção da Licença Prévia. A aplicação do cadastro socioeconômico será previamente divulgada à população do entorno do empreendimento”.

Ainda, segundo a Copel, nesse momento, mesmo tendo sido falado em números de atingidos, “não tem como saber ainda quantas áreas vão ter que ser desocupadas totalmente. Esses 11 ficam no limite final do reservatório, em áreas onde a água só chegaria se o reservatório subisse muito acima do normal e isso tem pouca probabilidade. Todos esses casos serão confirmados mais adiante, com a demarcação precisa da cota de alagamento”.

Mesmo sem o número exato de pessoas impactadas com o empreendimento, já se sabe quais as localidades afetadas. Em Pato Branco, famílias das comunidades Sede Gavião, Linha Esperança e Rondinha terão algum impacto. Já em Coronel, os lindeiros de Santo Antônio do Salto Grande, Rio Quieto, Mãe Rainha, Navegantes e Palmeirinha serão os atingidos.

Afinal, as famílias são contra a usina?

“Não. Nós das famílias atingidas não somos contra. Não nos posicionamos contra a construção, desde que sejamos bem indenizados por nossas propriedades de terras. Queremos ser recolocados em áreas satisfatórias, de iguais a melhores áreas que temos hoje”.

E o valor da indenização, já se sabe?

Ainda não. De acordo com a assessoria da companhia, a única informação concreta até o momento é que os R$ 400 milhões de investimento, divulgado nas audiências públicas, será dividido entre a obra e as indenizações, que variará conforme a avaliação das propriedades e benfeitorias.

A barragem da Usina Hidrelétrica de Salto Grande será construída nas margens da comunidade Sede Gavião, na linha Caprini, em Pato Branco; e nas margens da comunidade de Santo Antônio do Salto Grande, em Coronel Vivida.

Quem são os moradores atingidos em Coronel Vivida?

Grande parte dos moradores afetados com a instalação do empreendimento vive naquela região há, aproximadamente, 50 anos.

De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Coronel Vivida, Eder Ribeiro Borba, a maioria dos agricultores que mora hoje ali, nasceu no local. “Herdaram de seus pais a terra e sempre trabalharam produzindo alimentos. Agora aposentados, terão que ir pra outro local. Os jovens, que trabalham com seus pais, estão na fase da sucessão da propriedade e também não sabem seu destino”, comenta Borba, falando que só no lado de Coronel são 100 famílias afetadas.

O que diz a Copel sobre outras formas de indenização ao Diário

Conforme a companhia, as realocações podem ser realizadas por carta de crédito, desde que indicadas nos laudos sociais, feitos através do cadastro socioeconômico.

“É uma medida para quem perde a condição de subsistência e pode ficar vulnerável socialmente. Neste caso, todo esse processo de aquisição da nova terra acontece com apoio da equipe fundiária designada pela Copel, já que a nova área tem que apresentar características que permitam a retomada do modo de vida do agricultor e as famílias realocadas serão acompanhadas por uma equipe da área social. Agora, a experiência da Copel em empreendimentos recentes mostra que a maioria dos proprietários, quando não tem essa situação de vulnerabilidade social, prefere a indenização por valor de mercado – em que a Copel ressarce em pagamento à vista, porque, neste caso, não há incidência de Imposto de Renda sobre a diferença entre o valor que ele paga na nova propriedade e o que ele recebeu na indenização”, disse a assessoria.

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